(Is 49, 1-6; Sal 139; At 13, 22-26; Lc, 1, 57-66.80)
Paolo Cugini
1. Celebramos, neste domingo, a solenidade do nascimento de
João Batista, do homem escolhido por Deus para anunciar ao mundo a vinda de
Jesus Cristo, o nosso Salvador. Não é por acaso, então, se a liturgia da
Palavra de hoje nos oferece textos os quais nos convidam a refletir sobre o
mistério da vocação. A importância de João Batista na economia da historia da
salvação é evidenciada pelo mesmo Jesus que define João “o maior entre os nascidos de mulher”, pelo fato que foi escolhido
para anunciar a presença do Cristo no mundo. A vida de João Batista se
destacará pela dureza de vida que levava, pela sobriedade, pela força da sua
pregação e pelo convite á conversão. João Batista se preparou à vinda de Jesus
no deserto, batizando as multidões com a água do rio Jordão, batismo que era um
convite a mudar de vida, a buscar o caminho de Deus. João nasceu em
circunstâncias estranhas, não comuns. A mãe Isabel era estéril e o pai Zacarias
já de idade avançada. Desde o nascimento, tudo na vida de João é envolvido no
mistério, no ignoto. Aproveitamos, então, das leituras de hoje, para tentarmos
penetrar o mistério do chamado de Deus. Pedimos ao Espírito Santo que abra a
nossa mente para entendermos o sentido do nascimento e da vida de João Batista
pela humanidade e para nós.
2. “O Senhor chamou-me
antes de eu nascer, desde o ventre de minha mãe ele tinha na mente o meu nome”
(Is 49, 1).
São estas as primeiras
palavras do segundo canto do servo, que narram a vocação de uma personagem
misteriosa, que nunca a tradição conseguiu a detectar. Personagem misteriosa
como misteriosa é a vida de João. Poderíamos dizer que este mistério envolve a
nossa mesma vida. É interessante parar para refletir sobre este dato, ou seja,
o fato que a Bíblia apresenta a vida como algo de misterioso, que está
escondido nos pensamentos de Deus. Isso é um convite a não abordar a vida de
uma maneira superficial, imediata, como se a vida de uma pessoa fosse medível
somente pelas características externas, pelos dados materiais. A Bíblia nos
ensina que o sentido da nossa vida está em Deus, ou seja, fora do nosso alcance
imediato. Para tomarmos conta da nossa existência precisamos de um esforço de
interiorização, precisamos entrar em contato com Deus, pois é Ele que conhece o
mistério da nossa existência antes do nosso mesmo nascimento. Para quem está
tomando a serio a própria vida, esta revelação representa uma grande liberdade
e, ao mesmo tempo, um grande desafio. É liberdade porque somos liberados do
peso de inventarmos a nossa vida: graças a Deus a nossa vida já tem um sentido
e, este sentido, é Deus mesmo que o definiu desde o inicio da criação. É também
um desafio, porque devemos aprender a desmaterializar a nossa existência, para
aprendermos a buscar o valor da nossa vida aonde ele pode ser desvendado, ou
seja, em Deus.
3. Estas mesmas reflexões são retomadas no famoso salmo 139,
que a liturgia nos convida hoje a rezar. “Senhor
vos me sondais e conheceis, sabeis quando me sento ou me levanto; de longe
penetrais meus pensamentos” (Sal 139, 1).
Se Deus me conhece e
penetra os meus pensamentos, se foi ele que me formou as entranhas e no seio de
minha mãe me teceu, significa que não sou sozinho. Quanta angustia leio às
vezes nos rostos das pessoas que encontro, por tudo aquilo que acontece na vida
delas, que parece até mesmo que Deus não esteja presente, que tudo seja em
balia do ocaso e que, de conseqüência, a nossa vida não tenha nenhum sentido. É
esta a grande tentação que enche a nossa alma e a nossa mente, confundindo os
nossos pensamentos, naquelas horas tristes e dolorosas em que experimentamos
uma espécie de abandono de Deus. Não,
Deus não nos abandona e nós não somos forçados a inventar a nossa existência, a
produzirmos sozinhos e desesperadamente um sentido da nossa vida, para não
escutarmos o vazio que nela percebemos. Aliás, talvez sejam estas as horas
melhores que Deus nos oferece, para não fugirmos no vazio das nossas ilusões,
dos nossos castelos imaginários, para penetrarmos no mistério da nossa vida e,
nessa profundeza, descobrirmos uma Palavra pessoal, única, uma palavra amiga,
que somente Deus conhece. Assim, estas leituras que escutamos na festa do
nascimento de são João Batista, deveriam produzir em nós o desejo de
aprofundarmos o mistério da nossa vida, de entrarmos em nós mesmos e escutarmos
a voz daquele que nos chama desde a criação do mundo. Só assim descobriremos
quanto, aos olhos de Deus, somos preciosos, que valor imenso tem a nossa existência
para Ele, valor tão grande que desde sempre preparou para nós um projeto, um
caminho. Somente deparando com este projeto misterioso e fantástico de Deus, os
nossos falsos projetos serão desmantelados. De fato, se a tristeza às vezes
enche os nossos corações, se a angustia acompanha os nossos dias, é porque vivemos
no tempo presente inventando literalmente a nossa vida, nos achando os donos da
nossa existência que, desta maneira, torna-se extremamente pobre,fraca, vazia.
A auto-suficiência humana é o pior pecado que podemos cometer, porque é uma
forma radical de resistência ao plano de Deus. Somos mergulhados numa cultura
que nos incentiva todo dia e toda hora a buscarmos o nosso caminho de forma
autônoma, independente de Deus e de todos.
Aonde podemos encontrar a luz que nos ilumina? Como percebermos que o
Senhor nos conhece no mais intimo (cf. Sal 139)? Como descobrirmos, assim como aconteceu com
João Batista, o sentido do nosso nome, da nossa vocação?
4. “Ele vivia em lugares
desertos, até o dia em que se apresentou publicamente a Israel” (Lc 1, 80).
Não existe melhor resposta
ao nosso problema, do que esta. João não teve pressa de se amostrar: esperou
até perceber que estava na hora. Até não percebermos dentro de nós a paz de
Cristo, é melhor ficarmos escondidos, também porque o mundo não merece a nossa
agonia. João esperou a resposta ao sentido da sua vocação no deserto, ou seja,
no silencio, na busca interior não desperdiçando palavras com colegas, mas
procurando, sobretudo o parecer de Deus. Por isso quando saiu, arrasou! Este
versículo é o programa de uma vida. Pode ser pouca coisa, mas para quem está
querendo levar a serio a própria única e breve vida, vale a pena escutar o
conselho.
Pe Paolo Cugini,
Tapiramutá-BA
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