sabato 4 marzo 2023

Homilia Domingo de Ramos/A

 




(Mt 21, 1-11; Is 50, 4-7; Sal 21; Fil 2, 6-11; Mt 26, 14-27,66)

 

Pe Paolo Cugini

 

 

1. Com a liturgia do Domingo dos Ramos a Igreja entra na assim chamada “Semana Santa”, uma semana carregada de valor espiritual, pois é nestes dias que lembraremos as horas terríveis que acompanharam Jesus na sua paixão e morte e na sua ressurreição. A semana santa é um mergulho dentro do mistério de Deus, um mistério escondido desde a criação d mundo, o mistério da morte do justo, do sacrifício do Filho querido, da doação radical e definitiva do Filho de Deus. Esta liturgia do Domingo dos Ramos se abre com uma contradição que, aliás, acompanha toda a vida de Jesus, ou seja, a mesma multidão que clamará pela morte em cruz de Jesus, está agora clamando pela sua glorificação. Este é já um primeiro elemento que podemos transformar em sentido espiritual: até quando permaneceremos na multidão não conseguiremos ter sobre Jesus uma opinião que nos permita um seguimento firme e um testemunho fiel. O tempo de quaresma, que está terminando, deveria ter nos ajudado a aprofundar o nosso conhecimento de Jesus, um conhecimento capaz de realizar um discernimento mais completo entre a proposta do mundo e a proposta de Deus. Sair da multidão: é isso que deveríamos fazer simbolicamente nesta semana santa, para deixar que o Espírito Santo nos ajude a penetrar o mistério da paixão e morte do Filho de Deus, que morreu por todos nós. Do ponto de vista geral poderíamos nos perguntar: quais são os ensinamentos que a narração da paixão e morte de Jesus pode trazer para nós hoje e fortalecer assim a nossa caminhada de fé?

 

2. Ele esvaziou a si mesmo, assumindo a condição de escravo... Humilhou a si mesmo, fazendo-se obediente até a morte, e morte de cruz” (Fil 2, 7.8).

Do ponto de vista existencial podemos afirmar que ninguém consegue dar um sentido á morte: é algo de negativo demais! Agora, segundo São Paolo, Jesus enfrenta a morte como coroamento de uma vida. A morte de Jesus é o ato definitivo de uma vida totalmente partida, totalmente doada. Esta doação é manifestada no caminho que Jesus realiza ao longo da sua vida, um caminho realizado ao contrario daquilo que humanamente podemos entender. Se, de fato, o mundo busca a gloria dos homens, de se colocar constantemente ao centro, buscando ficar acima dos outros, até humilhando os outros, Jesus ao longo da vida percorre o caminho na direção contraria, na contramão da historia, se abaixando, se humilhando, buscando o ultimo lugar, se fazendo não apenas irmão, mas sim servo. É percorrendo este caminho que Jesus encontra o tesouro, a vida eterna. A morte na cruz é o coroamento de uma vida em continua descida, na busca constante do ultimo lugar, do abaixamento extremo. Por isso, a cruz é considerada no Evangelho de João a hora definitiva, aonde Jesus manifesta a sua essência, a sua verdadeira identidade de Filho querido pelo Pai, de Filho amante do Pai. Neste ato extremo, assumido conscientemente, Jesus desvende a toda humanidade o sentido da vida que é amar, e amar é se entregar, se abaixar, se humilhar. Alem disso, a morte tem um outro importante sentido. Jesus morrendo na cruz manifesta que a Verdade nele ficou inquebrantável: ninguém conseguiu despedaçar, dobrar Jesus, a Verdade, o Caminho, a Vida. O mundo massacrou um corpo que ficou fiel até o fim. Aquilo que Jesus agüentou nas horas trágicas da paixão, demonstra que aquilo que Ele acreditava, dizia e fazia, era intrínseco á sua identidade. As suas palavras, os seus gestos eram fruto de uma pessoa integra, de uma só Palavra. Na cruz de Cristo as suas palavras e os seus gestos assumem um novo sentido. É a cruz que oferece a chave de interpretação definitiva de toda a vida de Jesus.

 

3.Então Jesus foi com eles a um lugar chamado Getsêmani e disse: ‘Sentai-vos aqui enquanto eu vou até aqui para rezar’” (Mt 26, 36).

Um outro dato que me parece importante chamar atenção no começo desta semana santa é a oração de Jesus. Ele, de fato, não rezava por dever, para cumprir um preceito: Jesus rezava por necessidade. A oração em Jesus não é algo de externo, do qual podia também fazer a menos, mas é sem duvida alguma algo de altamente intrínseco á sua vida. É isso que chama atenção. Na hora crucial da sua vida, no momento em que sabia que teria encontrado a morte, Jesus não se fechou numa atitude egoísta mas, como sempre, se abriu ao dialogo profundo com o Pai. Também neste caso podemos afirmar que a morte dá sentido á oração de Jesus, descortinando um grande mistério. Se de fato, para nós a oração apresenta sempre grandes problemas, pois nem sabemos direto o que pedir, e amiúde até esquecemos de rezar, não era certamente assim para Jesus. Nele a oração era algo de natural, uma exigência da sua mesma natureza. Jesus sempre ao longo da sua vida buscou o Pai: fez isso também nas ultimas horas da sua vida. A oração em Jesus é um dialogo vital, encharcado de vida, sentimentos, paixões, sensações, projetos. Tudo em Cristo é colocado nas mãos do Pai, nada fica de fora. Também nisso, na sua oração se manifesta identidade de Jesus como de uma pessoa totalmente integra. Nessa altura poderíamos nos perguntar: o que nos ensina a oração de Jesus nas ultimas horas da sua vida? A resposta poderia ser encontrada neste versículo: “Meu Pai, se é possível, afasta-se de mim este cálice. Contudo, não seja feito como eu quero, mas, sim, como tu queres” (Mt 26,39). A oração é verdadeira quando busca a vontade do Pai e não a própria. Aliás, o sentido da oração é isso mesmo: uma constante busca da vontade do Pai, pois para nós é difícil entender o que Deus Pai quer de nós. O problema é criar um estilo de vida no qual a oração expresse este desejo de sair de si mesmo, de abandonar o terreno do egoísmo, no qual gastamos amiúde as nossas energias, para nos dirigirmos na seqüela do Pai. A oração de Jesus na noite da sua paixão nos ensina que os sofrimentos e as desavenças da vida, em vez de se tornarem motivo de desespero, deveriam ser os momentos crucias para nos entregarmos na oração e, assim, nos abrirmos ao mistério da vontade do Pai.

 

4. É preciso sempre entrar na Semana Santa com muita cautela, deixando de lado toda forma de presunção, de clima rotineiro. Apesar de termos participado de muitas semanas santas, na realidade ela fica sempre além das nossas possibilidades humanas de esgotar o seu sentido.  O fascínio desta semana está no fato impressionante que, em Jesus o sofrimento e a morte tem um sentido, aliás, são um Caminho de salvação. Entender isso quer dizer se prontificar para percorrermos este mesmo Caminho que Jesus percorreu, que é o Caminho do Amor. Pedimos a Deus que nesta Eucaristia possamos receber a sabedoria para compreendermos este grande mistério e, ao mesmo tempo, a força para nos dirigirmos com firmeza no caminho da cruz.

HOMILIA Vº DOMINGO DE QUARESMA/A




(Ez 37, 12-14; Sal 130; Rom 8, 8-11; Jo 11,1-45)

 

Pe Paolo Cugini

 

1. Não é um caso que a liturgia de quaresma do ano litúrgico A, que estamos celebrando, é a mais antiga e é a liturgia que antigamente era utilizada como preparação para os catecúmenos. A seqüência dos temas encontrados ao longo dos domingos apresenta, de fato, uma linda catequese pré-batismal. Começando com o tema clássico das tentações, passando para o Evangelho da transfiguração do Senhor, continuando com o tema da água e depois da luz, pra chegarmos hoje ao tema da vida. Sem duvida este itinerário foi pensado para os catecúmenos em vista do dia do batismo, que antigamente era realizado na noite de Páscoa.  Por isso a celebração do tempo de quaresma é importante para todos nós batizados: nos permite, de renovar o sentido do nosso batismo, para pudermos assumi-lo com mais clareza e determinação.

A reflexão de hoje depara sobre o tema central da vida, daquela vida verdadeira que vem de Deus e que vence a morte. Precisamos parar para deixarmos que as palavras do Evangelho penetrem em nós moldando a nossa mente e incentivando ações novas.

 

2. “Esta doença não leva a morte; ela serve para a gloria de Deus, para que o Filho de Deus seja glorificado por ela” (Jo 11,4).

Aprender a ver tudo aquilo que humanamente se apresenta como doença, morte, fraqueza como caminhos que podem manifestar a vida: este é o primeiro grande ensinamento de Jesus no evangelho de hoje. O problema é entender como isso pode acontecer, ou seja, como podemos vislumbrar vida naquilo que humanamente se apresenta como morte. Naquilo que os homens enxergam como finito, doente, morto, Jesus percebe possibilidade de Vida, manifestação da gloria de Deus. É um olhar totalmente diferente sobre a realidade, que Jesus tem e que exige dos seus apóstolos. Além do mais, esta capacidade de olhar a vida também em situações de morte, em Jesus não foi somente um olhar externo, mas também interno, na sua mesma experiência. O encontramos, de fato, no Getsêmani agarrado ao Pai, para fugir a tentação de olhar como morte aquela situação horrorosa que estava enfrentando. Também em cima da cruz Jesus esbanjou vida para todos aqueles que encostavam ao madeiro. O exemplo mais deslumbrante disso foram as palavras de perdão que Jesus declarou pelos seus algozes (cf Lc 23, 39s.).

  A vida espiritual deveria produzir nos discípulos este novo olhar sobre a realidade. Pra isso acontecer é preciso ser mergulhados na vida que vem de Deus. Ninguém é capaz de enxergar vida se ele mesmo trilha os caminhos da morte. O primeiro milagre deste tempo de quaresma deveria ir muito além do afastamento do pecado; deveria produzir em nós a capacidade de ver aquilo que Deus enxerga na humanidade. Somente pessoas vivas, somente cristãos mergulhados na vida de Cristo arregaçarão as mangas para tirar a humanidade dos caminhos de morte. O compromisso com uma política mais justa, o envolvimento nos projetos sociais é fruto deste novo olhar dos cristãos. Apesar do tamanho do nosso pecado, seja ele qual for, Deus não descarta nada, mas sempre almeja a recuperação. Isso vale não apenas num sentido físico, mas também espiritual. Aprender a acompanhar pessoas espiritualmente mortas, até que elas possam voltar a viver cheias da esperança que vem de Deus: é este um grande serviço que a Igreja é chamada a realizar no mundo de hoje. Devolver vida, esperança a um mundo mergulhado na morte: é isso que Jesus nos pede hoje.

 

3. “De novo Jesus ficou interiormente comovido” (Jo 11, 38).

Ninguém entra no mundo da morte como anunciador da vida de Deus se não tiver um mínimo de compaixão no coração. Ser discípulo não é um trabalho qualquer: requer amor para o próximo, envolvimento emotivo, um coração sadio. Talvez o primeiro, ou pelo menos um dos sinais no caminho de conversão, seja mesmo esta transformação do coração, a capacidade de sentir com o outro, de viver o relacionamento com os irmãos as irmãs com empatia, e não com frieza. Como discípulos somos chamados a comunicar vida nos aproximando dos outros, sentindo e vivendo por dentro o drama da humanidade. Somente assim, com um coração compassivo, podemos nos aproximar á humanidade, não para julgá-la, mas sim para amá-la, sofrendo com ela e por ela. Por isso chama atenção a comoção de Jesus pelo seu amigo Lazaro: as suas lagrimas são um balsamo de amor pela humanidade. Que o Senhor, neste tempo de quaresma, possa moldar o nosso coração, abrandar as nossas almas, para conseguirmos sentir como ele sentia e, assim, anunciar o Evangelho não citando versículos a toa, querendo passar de especialistas da Bíblia, mas sim amando o povo, sentindo com ele.

 

4.Disse Jesus: tirai a pedra!... Tendo dito isso, exclamou com voz forte: Lázaro vem para fora!” (Jo 11, 39.43).

 O grito de Jesus, pedindo tirar a pedra do tumulo de Lazaro, é sem duvida uma das mais sugestivas e, ao mesmo tempo, das mais carregadas de simbolismo de todo o Novo Testamento. Lazaro pode simbolizar, do ponto de vista geral, a humanidade ainda não encontrada pelo Senhor. Acho, porém mais sugestivo e espiritualmente mais frutuoso, pensar aquilo que da nossa humanidade está ainda dentro do tumulo e que demora pra sair. Jesus grita para o morto sair: o que de nós está apodrecendo no tumulo da vida? De uma certa forma o trabalho do discípulo missionário consiste em dar continuidade á mesma ação de Jesus, de tirar as pedras dos túmulos que impedem as pessoas de viverem conforme ao plano de Deus. É nesse sentido que encontra valor todo o trabalho social que a Igreja desenvolve: tira as pedras da injustiça, da ignorância, as pedras da malandragem dos homens desonestos, as pedras que o mundo cego continuamente coloca, massacrando as possibilidades de vida dos irmãos, das irmãs. A humanidade cega e desnorteada sabe somente esconder os problemas (a pedra do tumulo), pois não consegue enxergar a luz da vida verdadeira e propor assim caminhos de saída. O grito de Jesus é como se fosse um grito terapeuta, que chega ao coração da consciência, para acordá-la, despertá-la. Existe toda uma humanidade (a multidão) que fica assistindo inerme a morte tomando conta do mundo: e nós de que lado estamos? O grito de Jesus expressa toda a força que a evangelização exige, toda a firmeza para que a morte não tenha a melhor sobre a vida. O amor quando é autentico é uma força irresistível, quando é mergulhado com as paixões humanas vira aquela fraqueza que abre o caminho para a morte da alma. Nos últimos versículos do Evangelho de hoje é expressada com a máxima evidencia a força que o amor de Deus realiza, um amor que passa através de pedidos claros ( “Desatai-o e deixai-o caminhar!”), de voz alta. O amor não é apenas um sentimento, mas sim a manifestação da presença de Deus na historia, uma presença que esbanja vida, transformando as aparências de morte. É este o caminho que Jesus quer que percorramos, para sermos no mundo testemunhas da vida.  Assim seja.

HOMILIA IVº DOMINGO DE QUARESMA/A

 




(1 Sam 16, 1.6.6-7.10-13; Sal 23; Ef 5, 8-14; Jo 9, 1-41)

 

Pe Paolo Cugini

 

1. No caminho que estamos realizando no tempo de quaresma, a pergunta que deveria nos acompanhar é a seguinte: o que está acontecendo conosco? Que decisão estamos tomando perante a presença misteriosa e salvifica de Jesus Cristo na Historia? Todo o caminho do tempo de quaresma visa, de fato, ajudar os fieis para que se posicionem de uma forma clara perante a proposta de Jesus. O problema é que não é fácil se posicionar perante o Evangelho. O motivo desta dificuldade vem da nossa maneira de viver por assim dizer “relaxada”, desviando continuamente de toda forma de proposta que possa nos comprometer definitivamente, até quando chega o dia, a hora em que a vida aperta a corda ao nosso pescoço, até quando os eventos nos colocam com os ombros na parede e ali percebemos todo o nosso despreparo, toda a nossa superficialidade.   O Evangelho de hoje é interessante porque nos oferece uma panorâmica sobre as possíveis posições que a humanidade toma perante Jesus. Panorâmica, como veremos, embaraçadora pois, na maioria dos casos, somos nós com a nossa vidinha “fofa”, contornada de almofadas,  a serem estigmatizados.

 

2. “Os Vizinhos e os que acostumavam ver o cego – pois ele era mendigo – diziam ‘Não é aquele que ficava pedindo esmola?’” (Jo 9, 8).

 Quem não presta atenção ao seu vizinho dificilmente tem chance de perceber a presença de Deus na historia. Este pode ser a moral daquilo que é narrado nos primeiros versículos do texto do Evangelho de João que acabamos de ler. De fato, em cada irmão em cada irmã e contida a imagem de Deus.

Perante o milagre que Jesus opera aparece com força a superficialidade dos vizinhos. De verdade consideramos dignos da nossa atenção somente as pessoas que podem trazer pra nós um beneficio.  O cego mendigo é o símbolo daquela humanidade considerada sem importância e, então, insignificante, não digna de atenção e por isso fica despercebida pelo povo. São os invisíveis da sociedade, os excluídos. São estas pessoas invisíveis pela sociedade que Jesus com a sua presença rende visíveis e cheias de significado. Tempo de quaresma é tempo para avaliarmos o jeito da gente considerar as pessoas. Será que também nós fazemos distinção entre as pessoas, dividindo-as em classes? De que forma, então, consideramos os doentes, os pobres, os necessitados?

 

3. “Então havia divergência entre os fariseus” (cf. Jo 9, 16).

Existe uma categoria de pessoas que parece saber já tudo, que não tem nada mais para aprender. Os fariseus são o símbolo daquela humanidade arrogante e autoritária que ninguém merece encontrar na vida, mas que infelizmente nunca faltam nos caminhos da historia. No episodio narrado no Evangelho fica até esquisita a petulância com que perseguem o coitado curado por Jesus. Parece até que ficaram com raiva dele pelo fato da cura. A insistência é tão grande que até chegam negar a realidade. É este que o evangelista quer nos ensinar: quem nega Jesus e a sua obra nega a realidade, pois é Cristo a Verdade, é Ele que manifesta a toda a humanidade o caminho da vida, da realidade. Ao mesmo tempo, porém, é importante notar que a presença de Jesus cria divergências. Jesus incomoda: este é o problema. A presença dele exige sair das falsas seguranças. Nem todo mundo é disponível para isso. Nem todo mundo é disponível abrir mão do próprio jeito de crer, da própria maneira de pensar as coisas. Os fariseus são o símbolo da resistência que a humanidade tem perante a proposta de Jesus, perante a novidade absoluta da sua mensagem. Existe todo um farisaísmo disfarçado de religiosidade, que age em nós e se manifesta na tentativa de aniquilar todas as formas de pensamento diferente do nosso: o importante é não mudar. Este farisaísmo religioso é sem duvida uma das piores doenças da alma, de difícil solução e também de difícil cura. É bom lembrar que Jesus morreu por causa disso.

 

4. “Os seus pais disseram: ‘Sabemos que este é o nosso filho e que nasceu cego. Como agora está enxergando não sabemos...’ Os seus pais disseram isso porque tinham medo das autoridades judaicas” (Jo 9, 19-22).

Além das atitudes que já analisamos, existe uma outra que é típica da realidade na qual vivemos. É o comportamento que não consegue se decidir por Jesus por causa do medo. Quantas pessoas, na nossa realidade Nordestina, vivem esta situação constrangedora! Quantas pessoas não conseguem se libertar das amarras do poder e ficam a vida toda atreladas a um poder que, na realidade não permite de crescer, de se desenvolver. Este é o grande drama enfatizado na figura dos pais do cego: o medo atrapalha não apenas a existência corriqueira, mas, sobretudo o desenvolvimento espiritual. E como é que se manifesta a vida no medo? Com a incapacidade de tomar uma posição clara perante a realidade, seja ela qual for. Os pais do cego curado que não querem admitir a evidencia dos fatos, são o símbolo daquela humanidade que não quer se comprometer nunca por medo de criar problemas, de atrapalhar o poder instituído e, assim, nunca conseguem  desenvolver uma ação que seja fruto de uma busca pessoal da verdade. Quem quiser passar a vida toda querendo se dar bem com todo mundo, em modo especial, querendo ser bom com o poder, vai acabar se dando mal com todos e, de uma forma especial, se dando mal consigo mesmo e com Deus também.

 

5. “Acredita no filho do homem? Quem é Senhor para que eu creia nele? ‘Tu o estás vendo; é aquele que está falando contigo’. Exclamou ele:” Eu creio, Senhor!”(Jo 9, 36).

Chegamos, então, a analisar a única e justa atitude que precisamos ter perante Jesus e a sua proposta. O cego é protótipo da humanidade que vive na frente do Senhor em obediência á sua Palavra. O cego fica curado porque obedece ao mandamento de Jesus: este é o primeiro dado importante que é preciso salientar. Não basta a Palavra de Jesus: é necessária, também, uma tomada de posição clara, que se realiza na obediência á sua Palavra. Em seguida o cego realiza um caminho progressivo de libertação que o levará até a bater boca com os fariseus, vencendo o medo dos pais, e a se posicionar claramente do lado de Jesus, vencendo a indiferença dos vizinhos. O cego seguindo Jesus, realiza uma caminhada vocacional saindo de todos os obstáculos que a humanidade vive, tornando-se assim capaz de um pensamento autônomo perante o Senhor. Esta é a força liberatória de Jesus: Ele veio para libertar o homem do medo de viver, do medo de ver, do medo de ser. Só seguindo Jesus, só se deixando tocar por Ele, Só deixando que ele toque os nossos olhos cegos podermos enxergar a realidade e, assim, acompanhá-lo no caminho da vida verdadeira. Que esta quaresma, que estamos vivendo, possa produzir em nós o desejo de ver, a força para abandonar as amarras do mundo no qual somos atrelados e, assim, acompanhar o Senhor Jesus no Caminho da Vida. Assim seja.

HOMILIA IIIª QUARESMA/A

 



(Ex 17,3-7; Sal 95; Rom 5, 1-2.5-8; Jo 4,5-42)

 

Pe Paolo Cugini

 

 

1. Qualquer caminho cansa: também Jesus cansou. De fato, o encontramos hoje sentado ao poço de Jacó, “cansado da viajem”. Jesus carrega nos seus ombros o cansaço de uma humanidade desnorteada, perdida, que não consegue mais encontrar o caminho de volta ao Pai. Jesus assumiu a condição humana, se fez carne e veio a morar no meio de nós, “ele mesmo foi provado em tudo como nós, com exceção do pecado” (Hb 4, 15), por isso é capaz de entender o nosso sofrimento, a nossa incapacidade crônica de permanecermos firmes no nosso propósito de segui-lo. Jesus é como um de nós, só que tem algo de diferente, que faz a diferença: este algo é a divindade que Jesus veio para nos comunicar. Sendo que nós não sentamos, não paramos um instante, vivendo numa constante fuga de nós mesmos, ele mesmo um dia sentou perto do poço de Jacó, para entrar em dialogo com a humanidade desnorteada. Este é um primeiro dado importante que precisamos salientar neste terceiro domingo de quaresma. Deus nos convida a sentar, pra descansar e dialogar com ele. Diziam os antigos filósofos gregos que a coisa mais importante que um homem pode fazer, a tarefa maior de todas é cuidar de si mesmo e, para os filósofos gregos queria dizer cuidar da própria alma. Corremos o dia todo, a vida toda atrás de algo que parece importante e sem duvida é importante mas, podemos nos perguntar:  existe algo de mais importante que cuidar de si mesmo, de cuidar da própria alma? Jesus mesmo um dia disse que o mandamento maior de todos era o mandamento do amor: ama os outros como a ti mesmo. É isso que dificilmente fazemos: amar a nós mesmo, zelar da nossa alma, da nossa interioridade. Este deveria ser a base de qualquer outra decisão. De fato, como podemos pensar de aconselhar os outros se nem sabemos quem somos? Como podemos pensar de dizer uma palavra amiga, uma palavra de conforto, uma palavra orientadora se vivemos no esquecimento de nós mesmos, se vivemos arrastando a barriga no chão? Tempo de quaresma é tempo para aprendermos a zelar de nós mesmos, de dedicar tempo ao conhecimento de nós mesmos. Só assim, com a alma reconciliada conosco podemos reaprender a dialogar com os outros.

 

2. Outro aspecto importante do dialogo de Jesus com a mulher samaritana é o mesmo conteúdo do dialogo. Durante o dialogo os assuntos que Jesus puxa são sobre a vida concreta da mulher. O dialogo começa sobre a vida corriqueira, sobre o problema da sede e da água e depois vai se aprofundando sobre a vida afetiva e familiar da mulher Samaritana. Vale a pena frisar isso porque se a oração do cristão é um dialogo com Jesus, então o conteúdo deste dialogo deve começar sempre a partir da nossa vida concreta. Aprender a deixar que Jesus entre com o seu Espírito e com a sua Palavra na nossa vida pessoal, é o grande desafio da vida espiritual. Muitas vezes, de fato, a nossa vida espiritual é extremamente separada e distante da nossa vida corriqueira, uma separação fruto de um mal entendido, como se a gente tivesse estabelecido um espaço especifico por Deus, para não deixá-lo entrar no nosso. Toda vez que separamos a vida concreta, do dia a dia, com a vida espiritual, a vida cultual é porque não queremos que Deus se meta na nossa vida. Pelo contrario, nesta imagem do dialogo de Jesus com a mulher Samaritana, é bastante ressaltada a intenção de Deus de curar o nosso cotidiano, salvá-lo de toda forma de egoísmo, purificá-lo de qualquer fechamento e assim abri-lo para que possa ser um espaço disponível para o amor e a misericórdia de Deus.

Além do mais, esta atitude de Jesus nos oferece algumas indicações metodológicas de extrema importância sobre a evangelização. Jesus hoje nos ensina que o Evangelho, o anuncio do Evangelho passa através de um relacionamento vivo e concreto com as pessoas, relacionamento cujo conteúdo não é feito de teorias teológicas estrambeladas, mas sim da vida autentica. O Evangelho é o Verbo que se fez carne e para anunciá-lo, para que o seu conteúdo passe no mundo para transformá-lo por dentro, necessita ser encarnado. Talvez esta cultura pós-moderna dominada por atitudes que incentivam o individualismo de um lado, e do outro a necessidade de não se envolver de mais com os problemas dos outros, está afetando os mesmos evangelizadores. Resgatar esta linda atitude de Jesus, que se aproxima às pessoas na sua vida concreta dialogando de problemas concretos, como caminho para abrir a alma ao encontro autentico com Deus, poderia ser um dos objetivos desta quaresma.

 

 

3. Está chegando a hora, e é agora, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade” (Jo 4, 23).

Somente pondo atenção a nossa vida concreta poderemos entender a profundeza deste versículo. Quando vivemos distraídos, dominados pelo nosso egoísmo, nos aproximemos de Deus com pedidos egoístas, materiais. Este é na realidade o primeiro nível da vida religiosa, que caracteriza a espiritualidade popular. Nesta altura, Deus é importante na medida que satisfaz as nossas necessidades. É desta visão materialista, deste relacionamento comercial que Jesus pede de sair. E isso não é muito fácil, pois somos acostumados a tratar Deus como um objeto, apesar das aparências. Jesus hoje nos pede de se relacionar com Deus como ele mesmo fazia, ou seja, no espírito e na verdade. Quer dizer isso e como fazer isso? A resposta a estas duas perguntas é de suma importância, pois Jesus mesmo nos lembra que o Pai está procurando tais adoradores. Aprender adorar a Deus na Verdade significa parar de por atenção no nosso relacionamento com Deus aos nossos problemas, para fitar os olhos na Verdade de Deus que ele mesmo manifestou no seu Filho Jesus. Neste sentido a verdadeira oração aquela que Deus gosta, é uma romaria lenta e progressiva fora de si mesmo. A autentica oração que tem como ponto de partida o Evangelho de Jesus, ou seja, a Verdade, visa transformar a existência egoísta e recheada de mentiras dos fieis, em uma existência autentica, moldada na Verdade de Cristo. É claro que pra fazer isso precisamos de um mestre, que é o mesmo Espírito Santo, que nos guia no entendimento profundo da palavra de Deus, para que ela molde não apenas o nosso pensamento, mas sobretudo transforme a nossa vida, as nossas atitudes. Aprender a escutar o Evangelho deixando que seja o Espírito a oferecer a interpretação, necessita uma atitude corriqueira ao silencio interior e, ao mesmo tempo, um progressivo afastamento de qualquer forma de espiritualidade superficial e materialista. Por isso, por este tipo de oração,  não é mais necessário um lugar o um edifício especifico, mas sim a capacidade de entrar em si mesmo pra escutar a voz do Espírito que fala ao coração. Mais uma vez o caminho que hoje Jesus aconselha para todos nós não é uma fuga no intimismo, mas sim um convite a descobrir os tesouros autênticos da vida interior. Pois somente uma pessoa totalmente integrada consigo mesma, uma pessoa acostumada a lidar com os próprios limites não recorrendo ás técnicas psicológicas, mas sim ao amor misericordioso de Deus manifestado em Jesus e derramado nos nossos corações por meio do seu Espírito (Cf.  Rom 5,5: segunda leitura de hoje), terá algo de novo pra dizer neste mundo. Não é um projeto político externo que salva o mundo, mas sim pessoas totalmente renovadas por dentro: é esta a grandiosa obra que Deus quer realizar, obra silenciosa escondida e, por isso, difícil de entender e de aceitar. Neste sentido o Evangelho de hoje é de extrema importância pois nos revela que o conteúdo da sua Palavra de salvação, que é ao mesmo tempo o Caminho, é desvendado num dialogo pessoal. Pedimos a Deus a humildade, neste tempo de quaresma, de aceitar esta proposta para entrarmos como interlocutores deste dialogo.

IIª de qauresma/A

 



(Gen 12, 1-4; Sal 33; 2 Tim 1, 8-10; Mt 17, 1-9)

 

 

1. O tempo litúrgico da quaresma que estamos celebrando é um estupendo itinerário espiritual, que visa preparar os fieis para contemplar o mistério da paixão, morte e ressurreição de Jesus. Na primeira etapa deste itinerário, a liturgia nos ajudou a tomar consciência da nossa realidade, da nossa condição humana, que é uma condição de fraqueza, extremamente sensível ás sugestões que o mundo oferece. Para conseguirmos acolher a luz da Ressurreição, que brilha no mundo através da Páscoa de Cristo, precisamos realizar este itinerário que a liturgia de quaresma nos oferece, um itinerário que nos levará, ao longos destes domingos, no interior da mesma humanidade, para nos mostrar as condições de possibilidade de uma vida nova. De uma certa forma, aquilo que a liturgia quer nos propor é um itinerário catecumenal: saindo do mundo do pecado, passando pelo deserto da vida, caminhamos para entrarmos no Reino de Deus. O problema que nos angustia é saber se existe de verdade a possibilidade de um estilo de vida diferente, uma vida encharcada de amor e de justiça, ou se somos condenados para sempre a viver mergulhados no egoísmo, arrastados pelas paixões. Quais são as etapas que o itinerário de quaresma nos sugere para vivermos de uma forma mais autentica, aquela vida que vislumbramos na existência humana de Jesus?

 

2.Sai da tua terra, da tua família, da casa de teu pai e vai para a terra que eu te vou mostrar” (Gen 12, 1)

Se quisermos de verdade sair do mesmismo, da vida podre da multidão, precisamos fazer um esforço que exige um ato da nossa vontade: sair, romper, nos afastar, tomar distancia.

Dos relatos das leituras de hoje, fica bem claro este aspecto: por todos aqueles que sentem-se atraídos pela proposta do evangelho e desejam se conformar a vida de Cristo, o primeiro e insubstituível passo é um afastamento de tudo aquilo que  ainda hoje representa por nós um caminho de morte, uma existência de morte. De Fato, fica claro por todos que quem anda com corruptos se torna corrupto, que anda com ladrões se torna ladrão, quem anda com viciados antes ou depois pode entrar no mesmo caminho. Assim, vale também no sentido positivo. Se quisermos aprender a viver a justiça de Deus precisamos freqüentar pessoas justas, se quisermos aprender a amar precisamos freqüentar pessoas que partilham a própria vida para os outros. Ruptura com o mundo do pecado é a exigência básica para buscarmos a vida autentica que Jesus veio nos oferecer gratuitamente: basta só acolhê-la.   E assim Abrão foi convidado por Deus a sair de sua terra para receber a benção e a promessa de uma grande dinastia. E Abrão foi, saiu. Também Jesus um dia tomou consigo Pedro Tiago e João e subiram o monte e ali os discípulos viram a gloria de Deus na transfiguração das vestes de Jesus. Se quisermos ver a transfiguração, a transformação da nossa humanidade, precisamos realizar este primeiro passo na nossa caminhada espiritual: nos afastarmos da multidão, que não é nada mais que uma metáfora para sublinhar a necessidade de tomar distancia com toda aquela realidade de morte na qual a nossa vida é mergulhada, atolada e nos impede de dar passos decisivos no caminho da conversão tão almejada. Esta indicação está na base de um principio espiritual fundamental: as coisas de Deus se compreendem somente fazendo aquilo que Ele pede. O conhecimento de Deus não acontece por um simples esforço mental, racional. A mente, para entender as coisas de Deus, exige a experiência, a vivencia daquilo que Deus pede. Na primeira leitura Abrão conhece a verdade de Deus pelo fato que ele faz exatamente aquilo que Deus pediu. Abrão na tradição bíblica é considerado o nosso pai na fé. Se isso é verdade quer dizer que a fé se alimenta com a vivencia da Palavra de Deus. Não podemos pensar de mudar de vida se não colocamos a nossa existência fora dos caminhos de morte.

 

3. Naquele tempo, Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, seu irmão, e os levou a um lugar á parte, sobre uma alta montanha. E foi transfigurado diante deles” (Mt 17, 1).

Porque a nossa humanidade não se transfigura? Porque as nossas atitudes erradas permanecem grudadas em nós ao longo dos anos? Para respondermos a esta difícil pergunta, precisamos responder a uma outra, que também não é tão fácil. Em que condições se encontra a nossa vida espiritual? Como pretendemos mudar de atitudes se não dedicamos tempo á leitura, á meditação, á vida de oração? A humanidade de Jesus se transfigura na montanha, que é o símbolo do encontro do homem com Deus. É bom salientar, também, que não é qualquer oração que transfigura a nossa humanidade, não é qualquer experiência religiosa que modifica a nossa existência. Em Jesus nós encontramos uma busca constante de Deus, um dialogo pessoal, intenso. Parece que Cristo não cansava nunca de dialogar com Deus, o procurava toda hora, dedicava noites, madrugadas, dias. Muito diferente é a nossa vida espiritual, feita de breves momentos exaltantes e longos períodos de ausência de Deus.  Quanto mais a nossa mente se preenche de Deus tanto mais desejamos ser como Ele. O cuidado com a nossa vida espiritual é um elemento essencial no caminho da transformação da nossa vida. Precisamos ser inteligentes para organizarmos a nossa vida de uma forma tal que estejam sempre presentes no nosso dia a dia momentos prolongados de oração, do jeito que Jesus rezava, ou seja, dialogando com Deus.

 

4.Ele não só destruiu a morte como também fez brilhar a vida e a imortalidade por meio do Evangelho” (2 Tim 1,8).

Quem tem um pouco de experiência espiritual sabe muito bem que não basta dialogar com Deus para modificar a própria natureza: precisamos assimilá-lo. É aquilo que acontece a Eucaristia. Buscar a Deus assim como Jesus nos ensinou significa interiorizar o Evangelho, para assimilar os seus conteúdos, moldar a alma do conhecimento de Jesus, desejar a realização do seu reino. A imortalidade que esbanja do Evangelho e que recebemos nos sacramentos, se manifesta num desejo de vida para todos. Por isso os cristãos se envolvem nos trabalhos sócias, inventando caminhos de partilha com os mais necessitados, se aproximando àquela parte da humanidade que o mundo descarta. E isso que a campanha da fraternidade deste ano nos pede: sermos transmissores de vida em qualquer ambiente e em qualquer situação. É claro que se trata não de qualquer vida, mas sim da vida do ressuscitado, vida que nós recebemos da Igreja e vida que transforma por dentro a nossa existência. É desta vida que o mundo precisa e é esta vida nova que somos convidados a espalhar.   A verdadeira transformação da alma produzida pela interiorização do Evangelho produz ao mesmo tempo o desejo de transformar o mundo, de querê-lo diferente. Não é um projeto político externo que pode transforma o mundo do jeito que Jesus quis, mas sim um lento processo de mudança interior que se repercute ao nosso redor. Que o Senhor possa produzir em nós através destas Eucaristias de quaresma, o desejo de um mundo melhor que passa através da transformação da nossa mesma humanidade. Cristo transforma o mundo transformando a nossa humanidade. Assim seja.

 

Pe Paolo Cugini, Tapiramutá-Ba

Iº Domingo de quaresma/A





(Gen 2, 7-9; 3,1-7; Sal 51; Rom 5, 12-19; Mt 4, 1-11)

 

 

1. Com a liturgia da quarta feira de cinza entramos no tempo de quaresma, um tempo privilegiado para modificar as nossas atitudes erradas e buscar a vontade de Deus. As leituras deste primeiro domingo de quaresma tentam de nos ajudar a lidar com o pecado, ou seja, com a inclinação típica do coração humano de rumar um caminho diferente daquele que Deus oferece. È este um tema que mexe muito conosco, pois percebemos a nossa fraqueza e, ao mesmo tempo a nossa vulnerabilidade perante aquilo que o mundo com as suas seduções, nos propõem. Além do mais, é esta mesma fraqueza que experimentamos todos os dias, o maior questionamento á nossa caminhada de fé. Quantos, de nós, de fato, perante uma queda mais ou menos ruinosa, já pensaram de desistir da caminhada ou até mesmo desistiu, achando de ser fraco de mais para continuar e almejar a santidade. As leituras de hoje nos oferecem algumas respostas aos nossos questionamentos.  Pedimos ao Espírito Santo que nos ajude a interiorizar a Palavra de Deus deste domingo para conseguirmos finalizar a caminhada de quaresma com um pouco mais de força interior para enfrentar o mundo.  

2.A serpente disse a mulher: não, vós não morrereis” (Gen 3,4).

Na realidade, como nos lembra São Paulo na segunda leitura de hoje, através do pecado a morte entrou no mundo. O pecado se apresenta na nossa vida como oposição ao plano de Deus. O pecado se apresenta como algo de possível, como algo de verdadeiro que bate com a nossa busca pessoal de sucesso, de fama. A proposta do pecado solicita o nosso orgulho, o desejo de sermos considerados. O pecado tem uma proposta que mexe com a nossa identidade. Quanto mais resistimos, tanto mais a proposta se torna sofisticada e atraente. É dificílimo resistir á tentação do mundo: a historia da salvação narrada no Antigo Testamento é uma historia de fracassos sucessivos perante a proposta super atraente do mundo: mexe demais conosco. Além disso, a proposta do mundo rebaixa a proposta de Deus. Em alguns momentos do dialogo entre a mulher e a serpente – não a caso chamado o mais astuto de todos os animais – a proposta de Deus parece ridícula, até mesmo algo que prejudica o homem, se comparada com a proposta da serpente. Pra resistir tem que ser mesmos cobras criadas!

Se Deus é a Verdade isso quer dizer que a proposta do mundo é falsa. O problema é entender porque somos tão suscetíveis à proposta de morte do mundo. O que acontece em nós que com tanta facilidade deixamos que a morte entre na nossa vida destruindo tudo quanto estava sendo construído?

 Quando deixamos espaço na nossa mente ao projeto que o mundo insufla em nós, começa o conflito interior, a angustia. O projeto do mundo mexe, sobretudo com o desejo do homem de ser autônomo, de achar que pode viver autonomamente, que não precisa de Deus e de ninguém pra viver. O mundo, o projeto do mundo se apresenta como um projeto possível, real, que o homem pode abraçar sem nenhum problema: o homem pode se tornar o autor do próprio destino. O mundo faz de tudo para nos distanciar de Deus, para nos separar dele, pois somente assim, quando somos ignorantes do plano de Deus, da sua Palavra, quando desconhecemos a sua vontade, parece que o mundo tenha razão. Todo o esforço que fizemos para aprofundarmos o conhecimento de Deus, nos ajuda a manter firme a nossa opção e afastar assim a proposta do mundo.

 Quem deixa espaço ao projeto do mundo que o separa de Deus, é porque até então tinha vivido o próprio relacionamento com Deu não de maneira filial, mas sim com medo, ou como rotina, como algo de não personalizado. Somente um relacionamento pessoal com Deus, do tipo que Jesus nos mostrou, pode resistir à proposta atraente do mundo. Neste tempo de quaresma é bom aproveitarmos para recuperar o nosso relacionamento com Deus Pai, para aprendermos sempre mais a viver como criaturas debaixo do Criador.

 

3.A mulher viu que seria bom comer da árvore, pois era atraente para os olhos e desejável para se alcançar conhecimento” (Gen 3, 6).

A proposta do mundo, antes de ser um raciocínio, é uma tentação pelos nossos sentidos. Existe uma parte fraca do homem que Paulo chama de instintos egoístas, ou mais simplesmente de carne (cf. Rom 8). Carne não aponta apenas para os instintos sexuais, mas sim por toda aquela realidade que abre espaço ao nosso egoísmo: sede de sucesso, de fama, desejo de possuir bens materiais, desejo de dinheiro.  É ali que o mundo se apresenta porque sabe que é o ponto aonde somos mais vulneráveis, suscetíveis á queda. Lidar com os próprios sentimentos não é fácil. Somente uma clareza nos próprios objetivos, que podemos chamar de vocação, pode fortalecer a nossa identidade e ficar firme na hora que formos cutucados nos instintos, para não deixarmos que as paixões da carne nos arrastem por caminhos que, com o temo, se demonstrarão caminhos de morte. “Através do pecado entrou a morte. E a morte passou para todos os homens, porque todos pecaram...”(Rom 5, 12). É isso que São Paulo fala na segunda leitura de hoje. Pra nós que estamos querendo entender a proposta de Cristo para podermos vivê-la no nosso dia a dia, isso quer dizer que não se brinca com as paixões, não se brinca com a fraqueza humana. Quem vive mergulhado nos instintos, nos prazeres da carne é alvo fácil da proposta do mundo que é a morte da alma. Pra nós que estamos querendo dar um sentido a nossa vida, para que se torne vida autentica, precisamos vigiar continuamente.

 

4.Naquele tempo o Espírito conduziu Jesus no deserto, para ser tentado pelo diabo” (Mt 4, 1).

Jesus prepara a sua missão não nas festas ou nos bares bebendo cachaça, mas sim no deserto, no silencio, no jejum. São indicações existências de suma importância, que precisamos levar a serio, se de verdade estamos buscando uma vida diferente. Jesus é tentado como qualquer homem, qualquer mulher. O problema é que, enquanto a gente cai, Jesus fica de pé. Jesus é tentado nos mesmos nossos pontos fracos, mas Ele vence a tentação. Não são apenas versículos bíblicos que Jesus responde ao tentador, mas sim uma Palavra refletida, meditada, personalizada. É isso que faz a diferença. Aquilo que Jesus fala não são apenas palavras de outros, mas uma sua convicção. Esta convicção, que é o segredo da sua força, é fruto de uma busca pessoal de Deus, de uma luta interior, de um conhecimento profundo de si mesmo que é o resultado maduro do relacionamento com o Pai.

A Igreja nos oferece esta oportunidade que é o tempo de quaresma para vasculharmos a nossa vida e, assim, tentarmos um rumo mais profundo do nosso caminho de fé. Pedimos a Ele que nos ajude a não desperdiçar este tempo de graça.

 

Paolo Cugini, Pintadas-Ba.