(Gen 12, 1-4; Sal 33; 2 Tim 1, 8-10;
Mt 17, 1-9)
1. O tempo litúrgico da quaresma que estamos celebrando é um
estupendo itinerário espiritual, que visa preparar os fieis para contemplar o
mistério da paixão, morte e ressurreição de Jesus. Na primeira etapa deste
itinerário, a liturgia nos ajudou a tomar consciência da nossa realidade, da
nossa condição humana, que é uma condição de fraqueza, extremamente sensível ás
sugestões que o mundo oferece. Para conseguirmos acolher a luz da Ressurreição,
que brilha no mundo através da Páscoa de Cristo, precisamos realizar este
itinerário que a liturgia de quaresma nos oferece, um itinerário que nos
levará, ao longos destes domingos, no interior da mesma humanidade, para nos
mostrar as condições de possibilidade de uma vida nova. De uma certa forma,
aquilo que a liturgia quer nos propor é um itinerário catecumenal: saindo do
mundo do pecado, passando pelo deserto da vida, caminhamos para entrarmos no
Reino de Deus. O problema que nos angustia é saber se existe de verdade a
possibilidade de um estilo de vida diferente, uma vida encharcada de amor e de
justiça, ou se somos condenados para sempre a viver mergulhados no egoísmo,
arrastados pelas paixões. Quais são as etapas que o itinerário de quaresma nos
sugere para vivermos de uma forma mais autentica, aquela vida que vislumbramos
na existência humana de Jesus?
2. “Sai da tua terra, da
tua família, da casa de teu pai e vai para a terra que eu te vou mostrar”
(Gen 12, 1)
Se quisermos
de verdade sair do mesmismo, da vida podre da multidão, precisamos fazer um
esforço que exige um ato da nossa vontade: sair, romper, nos afastar, tomar
distancia.
Dos relatos
das leituras de hoje, fica bem claro este aspecto: por todos aqueles que
sentem-se atraídos pela proposta do evangelho e desejam se conformar a vida de
Cristo, o primeiro e insubstituível passo é um afastamento de tudo aquilo que ainda hoje representa por nós um caminho de
morte, uma existência de morte. De Fato, fica claro por todos que quem anda com
corruptos se torna corrupto, que anda com ladrões se torna ladrão, quem anda
com viciados antes ou depois pode entrar no mesmo caminho. Assim, vale também
no sentido positivo. Se quisermos aprender a viver a justiça de Deus precisamos
freqüentar pessoas justas, se quisermos aprender a amar precisamos freqüentar
pessoas que partilham a própria vida para os outros. Ruptura com o mundo do
pecado é a exigência básica para buscarmos a vida autentica que Jesus veio nos
oferecer gratuitamente: basta só acolhê-la.
E assim Abrão foi convidado por
Deus a sair de sua terra para receber a benção e a promessa de uma grande
dinastia. E Abrão foi, saiu. Também Jesus um dia tomou consigo Pedro Tiago e
João e subiram o monte e ali os discípulos viram a gloria de Deus na
transfiguração das vestes de Jesus. Se quisermos ver a transfiguração, a
transformação da nossa humanidade, precisamos realizar este primeiro passo na
nossa caminhada espiritual: nos afastarmos da multidão, que não é nada mais que
uma metáfora para sublinhar a necessidade de tomar distancia com toda aquela
realidade de morte na qual a nossa vida é mergulhada, atolada e nos impede de
dar passos decisivos no caminho da conversão tão almejada. Esta indicação está
na base de um principio espiritual fundamental: as coisas de Deus se
compreendem somente fazendo aquilo que Ele pede. O conhecimento de Deus não
acontece por um simples esforço mental, racional. A mente, para entender as
coisas de Deus, exige a experiência, a vivencia daquilo que Deus pede. Na
primeira leitura Abrão conhece a verdade de Deus pelo fato que ele faz
exatamente aquilo que Deus pediu. Abrão na tradição bíblica é considerado o
nosso pai na fé. Se isso é verdade quer dizer que a fé se alimenta com a
vivencia da Palavra de Deus. Não podemos pensar de mudar de vida se não
colocamos a nossa existência fora dos caminhos de morte.
3. “ Naquele tempo, Jesus
tomou consigo Pedro, Tiago e João, seu irmão, e os levou a um lugar á parte,
sobre uma alta montanha. E foi transfigurado diante deles” (Mt 17, 1).
Porque a nossa
humanidade não se transfigura? Porque as nossas atitudes erradas permanecem
grudadas em nós ao longo dos anos? Para respondermos a esta difícil pergunta,
precisamos responder a uma outra, que também não é tão fácil. Em que condições
se encontra a nossa vida espiritual? Como pretendemos mudar de atitudes se não
dedicamos tempo á leitura, á meditação, á vida de oração? A humanidade de Jesus
se transfigura na montanha, que é o símbolo do encontro do homem com Deus. É
bom salientar, também, que não é qualquer oração que transfigura a nossa
humanidade, não é qualquer experiência religiosa que modifica a nossa
existência. Em Jesus nós encontramos uma busca constante de Deus, um dialogo
pessoal, intenso. Parece que Cristo não cansava nunca de dialogar com Deus, o
procurava toda hora, dedicava noites, madrugadas, dias. Muito diferente é a
nossa vida espiritual, feita de breves momentos exaltantes e longos períodos de
ausência de Deus. Quanto mais a nossa
mente se preenche de Deus tanto mais desejamos ser como Ele. O cuidado com a
nossa vida espiritual é um elemento essencial no caminho da transformação da
nossa vida. Precisamos ser inteligentes para organizarmos a nossa vida de uma
forma tal que estejam sempre presentes no nosso dia a dia momentos prolongados
de oração, do jeito que Jesus rezava, ou seja, dialogando com Deus.
4. “Ele não só destruiu a
morte como também fez brilhar a vida e a imortalidade por meio do Evangelho”
(2 Tim 1,8).
Quem tem um
pouco de experiência espiritual sabe muito bem que não basta dialogar com Deus
para modificar a própria natureza: precisamos assimilá-lo. É aquilo que
acontece a Eucaristia. Buscar a Deus assim como Jesus nos ensinou significa
interiorizar o Evangelho, para assimilar os seus conteúdos, moldar a alma do
conhecimento de Jesus, desejar a realização do seu reino. A imortalidade que
esbanja do Evangelho e que recebemos nos sacramentos, se manifesta num desejo
de vida para todos. Por isso os cristãos se envolvem nos trabalhos sócias,
inventando caminhos de partilha com os mais necessitados, se aproximando àquela
parte da humanidade que o mundo descarta. E isso que a campanha da fraternidade
deste ano nos pede: sermos transmissores de vida em qualquer ambiente e em
qualquer situação. É claro que se trata não de qualquer vida, mas sim da vida
do ressuscitado, vida que nós recebemos da Igreja e vida que transforma por
dentro a nossa existência. É desta vida que o mundo precisa e é esta vida nova
que somos convidados a espalhar. A verdadeira
transformação da alma produzida pela interiorização do Evangelho produz ao
mesmo tempo o desejo de transformar o mundo, de querê-lo diferente. Não é um
projeto político externo que pode transforma o mundo do jeito que Jesus quis,
mas sim um lento processo de mudança interior que se repercute ao nosso redor. Que
o Senhor possa produzir em nós através destas Eucaristias de quaresma, o desejo
de um mundo melhor que passa através da transformação da nossa mesma
humanidade. Cristo transforma o mundo transformando a nossa humanidade. Assim
seja.
Pe Paolo
Cugini, Tapiramutá-Ba
Nessun commento:
Posta un commento