Ez 18,25-28; Salmo 24; Fp
2,1-11; Mt 21,28-32
Paulo Cugini
A controvérsia com
os fariseus e os líderes do povo continua no Evangelho de hoje e atingirá o seu
ápice no capítulo 23. Isto significa que estamos próximos. É o conteúdo desta
polémica que é importante para o nosso caminho de fé, porque revela a proposta específica
de Jesus. O contraste com os líderes religiosos de Israel deriva do facto de
não serem capazes de aceitar a proposta de Jesus, que é demasiado longe da
perspectiva religiosa deles. Este é precisamente o facto estranho: aqueles que
deveriam ter compreendido e acolhido o Filho de Deus são precisamente aqueles
que não o compreendem. Compreender o conteúdo deste mal-entendido significa
compreender onde Jesus quer nos levar com a sua proposta. Procuremos, então,
ouvir a parábola de hoje para continuar o nosso caminho de fé.
O
que você acha? Um homem tinha dois filhos. O início é semelhante ao
da parábola do filho pródigo. A parábola mostra duas atitudes diferentes diante
do pedido do mesmo pai. Há, portanto, um primeiro ponto de partida que é a
relação de paternidade e a forma de compreendê-la e vivê-la. O caminho da fé
começa na relação com o Mistério. O problema é entender como vivemos essa
relação, como nos enquadramos nela. Nessa perspectiva, os dois irmãos não são
muito diferentes, ainda representam o modelo religioso, uma relação legalista
com o pai, que provoca medo e possibilidade de transgressão. A relação filial
demonstrada por Jesus é muito diferente, marcada por um amor profundo
continuamente procurado e revelado em cada escolha e em cada atitude.
Qual
dos dois executou a vontade do pai?”. Eles responderam: "O primeiro."
Não
é o pertencimento que decide o sentido da nossa jornada. Depende de como
habitamos esse pertencimento. A reflexão que Jesus propõe ao comentar a
parábola é um convite a abandonar qualquer tipo de relação formal com Deus,
sobretudo, de todas aquelas formas de religião que se preocupam com a
aparência, mas não vão profundamente para mudar a humanidade da pessoa. São as
nossas escolhas, os nossos pensamentos que revelam como nos posicionamos diante
do Senhor. Esta é precisamente a ideia expressa pelo profeta Ezequiel ouvida na
primeira leitura: E se o ímpio se afastar da maldade que cometeu e fizer o
que é certo e justo, ele se vivifica ( Ez 18,27). Somos responsáveis por
nossas ações. Não somente. No caminho da fé, a teoria da acumulação não se
sustenta, porque se enquadra na doutrina do mérito criticada por Jesus no
Evangelho do domingo passado. Não existe nenhum banco de dados no céu que registre
o bem que fizemos, de modo que, se praticarmos algumas más ações, o bem
acumulado as cubra. O caminho da fé não segue este tipo de mentalidade mundana.
Sem dúvida, o caminho de seguir o Senhor não é linear, não é um progresso
constante rumo à luz. Passamos por momentos de grande entusiasmo, de grandes
descobertas espirituais e de belos momentos pessoais e comunitários. Quem tem
alguma jornada cristã sabe que também passamos por momentos difíceis, de
confusão e desorientação, a ponto de termos a sensação de ter retrocedido, de
ter regredido. Tudo está envolvido no caminho da fé, porque a nossa humanidade
é fraca e seguimos Jesus exatamente porque queremos que a força do seu Espírito
fortaleça a nossa humanidade e nos ajude a viver plenamente as escolhas que
fizemos. Por isso, no caminho da fé, o mal que praticamos deve ser humildemente
colocado nas mãos do Senhor para aceitar o seu perdão e, desta forma, continuar
o caminho.
E
Jesus disse-lhes: "Em verdade vos digo: os cobradores de impostos e as
prostitutas estão à frente de vós no reino de Deus. A explicação que Jesus
oferece para esta forte afirmação reside no facto de que, embora os principais
sacerdotes e os anciãos do povo não acreditaram nas palavras e ações de João
Batista, mas os publicanos e as prostitutas acreditaram nelas. O problema é
entender por que houve essa diferença de atitude em relação ao Batista. Há
orgulho e presunção na atitude dos sacerdotes, o que os impede de abrir espaço
para a inovação, de se questionar para criar espaço para uma discussão livre e
autêntica. A sua atitude fechada não lhes permite captar a novidade que o
Senhor demonstra. Pelo contrário, a proposta de Jesus encontra espaço nos
publicanos e nas prostitutas, porque a sua condição é tal que não têm qualquer
forma de orgulho que possa contrariar. Isto significa que só um coração humilde
é capaz de dar lugar à novidade da proposta do Senhor anunciada pelo Evangelho
e iniciar um caminho de conversão e de mudança de vida e de mentalidade.
Este caminho de
esvaziamento e de humilhação foi realizado pelo próprio Jesus, como nos recorda
São Paulo na segunda leitura de hoje: não considerou ser um privilégio ser
como Deus, mas esvaziou -se assumindo a condição de servo (Fl 2, 6). -7).
Jesus veio comunicar-nos a novidade do Pai não sentando-se numa mesa de professor,
mas colocando-se ao nosso nível e, por isso, esvaziou-se de tudo. É um coração
humilde, capaz de amar a todos, sem qualquer distinção ou discriminação. É a
humildade que é sinal daquele esvaziamento que é, ao mesmo tempo, um convite ao
interlocutor para entrar, para comunicar, porque há espaço. Assim dizia Santo
Agostinho ao comentar o prólogo de João: onde há humildade há caridade .