giovedì 25 aprile 2024

V DOMINGO DE PÁSCOA/B

 




Paulo Cugini

 

Em busca de pistas que indiquem a presença do Senhor Ressuscitado: este é o caminho que a liturgia do tempo pascal nos propõe. Uma procura que nem todos podem permitir-se, no sentido de que exige algumas exigências específicas e, em particular, estar num caminho, ou melhor, estar num caminho específico de discipulado. A Palavra não se abre à compreensão do seu significado senão para quem se propõe a seguir Jesus, na sua escola. Não se trata, então, de um conhecimento que fique no horizonte da mente, mas exige experiência, vivência, prática do que se ouve. E, portanto, as indicações destes Domingos de Páscoa pretendem ser as etapas de um caminho que o discípulo deve percorrer se quiser compreender o mistério contido no acontecimento da ressurreição, acontecimento compreensível apenas no contexto da fé.

Domingo passado a pista era uma pedra, hoje é um pedaço de madeira. A pedra tinha a especificidade de desperdício, a madeira indicada hoje é um ramo de videira. Por que Jesus escolhe precisamente este tipo de madeira para indicar a relação que deve existir com os discípulos que desejam conhecer o Ressuscitado? O profeta Ezequiel vem até nós e, a este respeito, pergunta-se: “Que vantagens tem a madeira da videira em relação a todas as outras madeiras da floresta... Poderia servir para fazer um objeto? Mesmo quando estava intacto, não servia para nada” (Ez 15, 2.5). A característica do ramo da vida é que ele pode funcionar, no sentido de que só pode dar frutos se permanecer ligado ao ramo específico: não pode ser utilizado para nenhum outro fim. Não é, portanto, uma madeira preciosa, como o carvalho ou o cedro do Líbano. A pista de hoje surge na sequência do domingo passado, ou seja, de material pobre, sem utilidade e, na verdade, inútil. E é precisamente este material inútil que Jesus utiliza para indicar o caminho a seguir para encontrar Cristo ressuscitado e viver da sua luz e da sua plenitude de vida.

Quem permanece em mim e eu nele dá muito fruto, porque sem mim nada podeis fazer” (Jo 15.5). O fruto que a nossa existência exige é o de uma vida capaz de amar no sentido que Jesus manifestou, ou seja, um amor que saiba partilhar. Recebemos o amor do Senhor ouvindo e interiorizando a sua Palavra, nutrindo-nos assim dele, e o fruto que esta relação única produz consiste na capacidade de ir ao encontro dos outros com gratidão e desinteresse, em qualquer circunstância em que nos encontremos na vida. Somos feitos para amar e amar de forma autêntica, altruísta, criando espaço para as pessoas que encontramos, ajudando todos a viver em plenitude de vida e liberdade. Quando isso acontece, significa que encontramos o Ressuscitado e vivemos nele e com Ele. É, portanto, uma relação interna, livre, que exige liberdade de escolha. Jesus promete a realização de uma vida plena naqueles que o procuram, o encontram e permanecem em relação com Ele. A luz da ressurreição que explodiu na manhã de Páscoa continua a iluminar o mundo através dos seus discípulos que vivem Nele e Dele.

“Amados, se o nosso coração não nos censura por nada, temos confiança em Deus” (1Jo 3,21). A consciência pessoal é a área em que verificamos o nosso caminho. Como compreender se as nossas relações são autênticas, no estilo indicado por Jesus, ou seja, livres e desinteressadas? É na consciência que se manifesta a vontade do Pai porque, como nos lembra o Vaticano II no documento Gaudium et Spes: “a consciência é o núcleo mais secreto e o santuário do homem, onde está a sós com Deus, cuja voz ressoa em intimidade” (GS, 16). Se é verdade que o vínculo com o Ressuscitado nos empurra constantemente para fora de nós mesmos, para tecer novas relações com as pessoas que encontramos, a ponto de este novo tecido existencial se tornar um sinal da presença do Ressuscitado no mundo, é igualmente verdade que é sempre necessário voltar a nós mesmos, para não correr o risco de nos perdermos e para verificarmos a bondade do nosso caminho. Há, portanto, um dinamismo entre o interno e o externo que caracteriza o caminho da fé, um caminho ameaçado pelo perigo de uma vida demasiado exposta na sociedade, ou demasiado fechada na intimidade. Será a abertura ao Mistério de Deus que nos permitirá, com o tempo, encontrar o justo equilíbrio.

 

lunedì 15 aprile 2024

4º DOMINGO DE PÁSCOA /B

 




Atos 4, 8-12; 1 Jo 3,1-2; João 10, 11-18

Paolo Cugini

 

    Indícios. É disso que trata a liturgia da Palavra do tempo pascal. Pistas, indícios que falam de uma presença que pode ser apreendida não com os sentidos da carne, mas com os espirituais e, por isso, exige uma atitude de pesquisa, de um caminho. Para poder reconhecer a presença que a pista pretende indicar é necessária uma relação de conhecimento prévio, uma experiência de quem procura. Neste tempo pascal foram-nos apresentadas diversas pistas da presença do Senhor ressuscitado entre nós. Do sudário deixado no túmulo ao modo de estar de Jesus na comunidade. Hoje as leituras nos oferecem outra, que suscita admiração, ou melhor, perplexidade.

“Jesus é a pedra que vocês rejeitaram, construtores, e que se tornou a pedra angular. Em nenhum outro há salvação” (Atos 4:11). Esta é o indício de hoje: a pedra descartada. Esta pista resume toda a vida de Jesus. Desde o nascimento até a morte, ele sempre foi descartado. Ele teve que nascer numa manjedoura porque não havia lugar para sua família nas casas da cidade (Lucas 2:7). No primeiro ato público narrado no Evangelho de Lucas, ele é expulso da sinagoga com a intenção de jogá-lo no precipício da montanha (Lc 4, 29). No evangelho de Marcos, depois de um dos primeiros milagres realizados no sábado, os fariseus, juntamente com os herodianos, decidem condená-lo à morte (Mc 3,6). Toda a vida de Jesus está envolta no mistério da rejeição que o mundo exerce em relação a ele. Um mistério que, para dizer a verdade, foi anunciado pelos profetas (cf. Is 53), mas que, quando se concretiza nos acontecimentos da história, deixa a pessoa maravilhada. O próprio Jesus, porém, na página de Mateus em que fala do juízo final (Mt 25,32ss), não se identifica com os poderosos da terra, com os que têm riquezas, fama, mas com os pobres, os presos, os famintos, os sedentos, ou seja: os descartados, os excluídos da história. O Espírito Santo que recebemos nos sacramentos ou quando o invocamos é o Espírito dos rejeitados, dos excluídos: quem o acolhe também participa, juntamente com Jesus, nesta exclusão. É importante seguir esta linha de reflexão para compreender onde procurar a presença do Senhor ressuscitado na nossa vida quotidiana. Sem dúvida, não se encontra nos palácios dos reis, ou seja, não se encontra onde habitualmente o procuramos, onde o hábito, forjado pela cultura dominante, nos leva a procurá-lo. É mais fácil encontrá-lo vasculhando os descartados da história, entre aquelas categorias de pessoas que a história sistematicamente expulsa. Houve um tempo em que os descartados eram os deficientes, e depois os leprosos que eram relegados para lugares fora da cidade. Os escravos, presença estranha que encontramos em muitas épocas e em diferentes áreas geográficas, eram considerados pessoas de segunda classe. Na época da colonização das Américas pelos países europeus, os descartados foram primeiro os africanos, arrancados de suas terras de origem para serem transplantados em solo africano exclusivamente para serviços escravistas; e depois os índios, para os quais o Papa teve que intervir com um documento oficial, para demonstrar que também eles tinham alma e assim interromper a carnificina levada a cabo pelos espanhóis e portugueses.  Pessoas famintas, vagabundos, bêbados, moradores de rua: em todas as épocas foram considerados desperdícios.

Hoje, na minha opinião, as pedras rejeitadas pela sociedade são os estrangeiros que chegam de barco e, sobretudo, os homossexuais, as lésbicas, os transexuais. São os excluídos, não só da sociedade, mas também daquela entidade que deveria fazer da hospitalidade a sua marca de reconhecimento: a Igreja. Se quisermos encontrar o Ressuscitado, devemos ir até eles, até aqueles que trazem na pele os sinais da exclusão, da marginalização e do desperdício.

Vejam que grande amor o Pai nos deu ao sermos chamados filhos de Deus e realmente o somos!” (1 Jo 3, 1). O dom que o encontro com o Ressuscitado presente nas pedras descartadas pode nos dar é a revelação da nossa dignidade, o que ninguém no mundo pode nos comunicar, exceto aqueles que o experimentaram: somos filhos de Deus, amados pelo Senhor. Só quem vive a exclusão e o abandono na própria pele pode descobrir que está rodeada de um amor diferente, que vem do fundo do coração e que pode comunicar a quem sinceramente se coloca no seu caminho. Somos filhos e filhas de Deus: é a maior verdade que podemos descobrir no nosso caminho. Uma verdade que nunca nos poderá ser contada por aqueles que passaram a vida pensando apenas nos seus interesses, acumulando casas, dinheiro, coisas, fechados nos seus próprios fortes. Uma verdade que, no entanto, pode ser-nos comunicada por aqueles que foram descartados pela história através de um mistério encerrado no coração misericordioso do Pai, que é também Mãe.

 

sabato 13 aprile 2024

TERCEIRO DOMINGO PÁSCOA B

 





Atos 3,13-15.17-19; 1 João 2.1-5a; Lucas 24, 35-48

Paulo Cugini

 

 

A liturgia da Palavra do tempo pascal oferece-nos pistas para aprender a captar a presença de Cristo ressuscitado no mundo. A Páscoa significa a passagem do mundo condicionado pela contingência humana para o mundo do Pai, que é o mundo do amor pleno e autêntico. Jesus realizou esta passagem de vida plena, mostrando o sentido autêntico do amor que vem do Pai, que é gratuidade, dom de si partilhado com os seus irmãos e irmãs. Participar nesta nova vida é o sentido do caminho pascal, redescobrir, ao mesmo tempo, a beleza de fazer parte da comunidade que se reconhece no Evangelho de Jesus.

“O próprio Jesus estava entre eles ” (Lc 24, 36). Há frases no Evangelho que parecem ser colocadas ali de passagem, para abrir uma discussão ou para fechá-la e, portanto, do ponto de vista literal, parecem inofensivas, sem um significado específico. E, em vez disso, se você olhar com atenção, essas frases aparentemente inofensivas apresentam uma profundidade de significado impensável à primeira vista. Nas aparições de Jesus aos discípulos, tanto no Evangelho de Lucas como no de João, quando Jesus aparece diz-se que: “ele estava no meio deles ”. Esta repetição deve, portanto, ter um significado. Na verdade, não se diz que Jesus, quando apareceu, estava na frente ou atrás, mas no meio. Esta especificação é provavelmente uma indicação para todas as comunidades de todas as épocas e latitudes que desejam viver seguindo o Senhor ressuscitado. Pois bem, a comunidade é um sinal visível do Ressuscitado quando as relações vividas se baseiam no princípio da igualdade, em que todos têm acesso ao Senhor sem qualquer distinção. Jesus aparece no meio para demonstrar ao mundo que a partir de agora todos aqueles que o seguem podem acessá-lo sem mediação de posição ou títulos, porque Nele somos todos filhos e filhas de Deus.

“E ele disse: A paz esteja convosco ” (Lc 24, 36). Quando a comunidade que anuncia o Senhor Ressuscitado vive relações de igualdade, desconstruindo por dentro os mecanismos agressivos de inveja, ciúme e ressentimento gerados pelo egoísmo humano moldado pelo instinto de sobrevivência, significa que algo novo está em andamento, a vida do Ressuscitado está em ação modificando a estrutura das relações, que de agressivas passam progressivamente a ser pacíficas, moldadas pelo amor do Senhor, então, sem dúvida, a paz reina na comunidade. A paz que vem de Deus é um dom que brota da comunidade que acolhe a Palavra do Ressuscitado, deixa agir o seu Espírito, para recriar no interior da consciência de cada um um novo modo de estar no mundo, de se relacionar, de interagir.

" Sou eu mesmo! Toque-me e olhe” (Lc 24,39). Quando a comunidade se alimenta e vive da qualidade de vida que vem do Ressuscitado, então Ele se torna visível aos olhos de todos aqueles que procuram um sentido para a vida, a ponto de poder “vê-lo e tocá-lo”. e, consequentemente, abre-se ao mundo uma possibilidade de fé no Senhor ressuscitado. É por isso que a comunidade cristã tem um papel fundamental na economia da salvação, porque pode tornar visível, tangível aos olhos do mundo a presença de Cristo ressuscitado. Quando aqueles que creem no Senhor permitem que o Espírito Santo recrie os traços da humanidade do Senhor, esforçam-se por viver como Ele viveu, procurando sempre a justiça, criando relações baseadas na misericórdia, permanecendo constantemente atentos aos pobres, às pessoas em dificuldade para ajudá-los a escapar da pobreza, então se torna visível, tangível que naquela parte da humanidade que age dessa forma, há o germe de uma vida nova em ação, manifestada pela ressurreição de Jesus.

Então lhes abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras ” (Lucas 24:45). A comunidade é sinal da presença do Ressuscitado, que se torna critério de compreensão das Escrituras. Certamente, as contribuições dos estudiosos da Bíblia são extremamente úteis para nós hoje, que vivemos há vários séculos de distância dos fatos narrados pelos Evangelhos, pois nos oferecem material indispensável para a compreensão da Palavra. Contudo, pelas palavras ouvidas no Evangelho de hoje fica claro que a nossa mente se abre à compreensão última da Palavra, quando temos a possibilidade de ver e tocar o que é narrado naquelas páginas. É na experiência da comunidade que partilha, que vive livremente, que gera relações de igualdade, que coloca os pobres no centro, que se torna possível compreender o significado profundo do Evangelho e, desta forma, torna-se possível anunciá-lo com alegria, porque percebido como uma mensagem autêntica.

 

TERCEIRO DOMINGO DE PÁSCOA/C

 

 


 

 Paolo Cugini

O tempo da Páscoa é o período do ano em que a Igreja nos convida a refletir de forma nova e original sobre o sentido da existência. A Páscoa, de facto, ao apresentar o tema do Ressuscitado, provoca a reflexão sobre o tema da vida, o seu significado e aquilo em que realmente vale a pena gastar energia. Em última análise, o Pai ressuscitou o corpo de seu filho Jesus que, durante sua vida, escolheu uma vida pobre, humilde, discreta, ou seja, não buscou a glória do mundo, o poder, o dinheiro. Este aspecto, na minha opinião, deveria suscitar reflexão. A ressurreição de Jesus lança uma nova luz sobre a história da humanidade e expõe a pobreza da proposta, totalmente desequilibrada no material, deixando muito pouco espaço para a dimensão espiritual. Vejamos, a este respeito, o que nos dizem as leituras de hoje.

Mandaram açoitar [os apóstolos] e ordenaram-lhes que não falassem em nome de Jesus. Depois, libertaram-nos. Saíram então do Sinédrio, felizes por terem sido julgados dignos de sofrer insultos pelo nome de Jesus (Atos 5, 40-41).

A situação narrada na primeira leitura é indicativa do que aconteceu com aqueles que conheceram o Senhor e o encontraram ressuscitado. Houve uma clara mudança na perspectiva existencial. De facto, passaram de uma atitude de medo e de abandono para com o Mestre, a ponto de o terem chegado a entregá-lo, a negá-lo e a abandoná-lo, para uma atitude em que se sentem felizes por terem sido indignados em nome É a realidade desta mudança que surpreende e se torna um testemunho que vale a pena ouvir para aprofundar a discussão sobre a ressurreição de Jesus, que tem consequências significativas para as pessoas que o encontram. O que aconteceu para provocar uma mudança radical? Como é possível que pessoas tão frágeis e medrosas rapidamente se tornem corajosas e capazes de argumentar as suas ações? Encontrar o Ressuscitado significa, entre outras coisas, precisamente isto: testemunhar uma passagem na própria humanidade que deixa uma marca profunda capaz de subverter a abordagem. Mudança que não tem explicação humana, que não pode ser explicada com instrumentos científicos ou psicológicos: há mais.

Eu, João, vi e ouvi as vozes de muitos anjos ao redor do trono e dos seres viventes e dos anciãos. O seu número era de miríades de miríades e milhares de milhares e diziam em alta voz:
«O Cordeiro que foi morto
é digno de receber poder e riqueza,
sabedoria e força,
honra, glória e bênção (Ap 5, 1s).

João vê a vitória de Cristo sobre a morte; ele não vê a cruz, mas um trono, sinal de vitória e no trono o próprio Deus com o cordeiro sacrificado ao lado dele. O interessante é que este cordeiro sacrificado, que claramente remete a Jesus, está de pé, em sinal de vitória: ninguém conseguiu dobrá-lo ou quebrá-lo. O ódio do mundo não prevaleceu sobre o amor de Jesus, simbolizado pelo facto de ser imaginado como um cordeiro abatido. Os cristãos que seguem o Senhor e se alimentam dele, alimentam a sua consciência com as suas palavras e a sua mensagem, veem no mundo não sinais de morte, mas de vitória. Onde o mundo vê a morte, os cristãos veem a vida. E como o cordeiro está de pé e venceu o ódio com amor, é digno de reverência receber o poder de Deus Pai. Ser sinal da vitória de Cristo sobre o ódio e a dinâmica da morte no mundo: esta é a tarefa dos cristãos no mundo.

Disse-lhe pela terceira vez: “Simão, filho de João, você me ama?” Pedro ficou triste porque pela terceira vez lhe perguntou: «Tu me amas?», e disse-lhe: «Senhor, tu sabes tudo; Você sabe que eu amo você." Jesus respondeu-lhe: «Apascenta as minhas ovelhas (Jo 21, 17).

No caminho da fé não somos testados pelo número de ritos e procissões em que participamos, mas exclusivamente pelo amor que damos. É necessário acrescentar que se podemos dar amor é porque o recebemos gratuitamente do Filho, através do Espírito Santo que o derramou nos nossos corações (cf. Rm 5,5). O bálsamo da misericórdia cura as feridas da alma de Pedro, que negou três vezes o Senhor. Não há sentimento de culpa, desespero, mas apenas misericórdia que cura as feridas. As relações que Jesus cria têm esta marca inequívoca: Ele não cava dentro do homem e da mulher para fazê-los sentir-se mal, mas para trazer à tona o bem que há em cada pessoa. 

 

martedì 2 aprile 2024

SEGUNDO DOMINGO DE PÁSCOA/B

 




Atos 4,32-35; 1Jo5,1-4; João 20,19-31

Paulo Cugini

 

Para nos ajudar a aprofundar o mistério da ressurreição do Senhor, a liturgia da Palavra, nestes domingos de Páscoa, oferece-nos um itinerário em que as leituras não só nos contam o encontro dos discípulos com Cristo ressuscitado, mas também o que acontece na vida das primeiras comunidades cristãs. Além disso, os evangelhos que ouviremos apresentam alguns personagens que devem nos ajudar no caminho para compreender o mistério da presença do Ressuscitado entre nós. Hoje, o personagem em questão é o apóstolo Tomé. Vamos ouvir suas instruções.

No Evangelho de João, o apóstolo Tomé aparece em algumas cenas significativas que, em certos aspectos, delineiam a sua personalidade. A primeira vez é mencionado no contexto da ressurreição de Lázaro no capítulo 11. Os discípulos manifestam a sua preocupação pelo facto de Jesus lhes ter comunicado a sua intenção de ir para a Judeia, porque naquela mesma região tinham ameaçado matá-lo. Depois da explicação de Jesus, que motivou a sua decisão, Tomé intervém dizendo: “Vamos também nós e morramos com Ele” (Jo 11, 16). É uma afirmação que revela sem dúvida o entusiasmo do discípulo no seguimento do Senhor, um entusiasmo que ao mesmo tempo esconde uma certa imprudência.

O facto de Tomé, na realidade, apesar do seu entusiasmo, não ter entendido bem a proposta e o caminho que Jesus apresenta ao mundo, torna-se claro no contexto da Última Ceia, quando Tomé fala novamente. Com efeito, depois de Jesus ter explicado aos discípulos que, apesar da sua morte, ia preparar um lugar na casa do Pai e que eles já conheciam o caminho, Tomé não concorda e afirma: « Senhor, não sabemos onde estás. indo: como podemos saber o caminho?” (Jo 14, 5). Como sabemos, a resposta de Jesus é muito clara: “Eu sou o caminho” (Jo 14,6). Neste contexto, Tomé revela que o seu entusiasmo por Jesus expresso no contexto da ressurreição de Lázaro, não se baseou na realidade em motivações sólidas, a tal ponto que ainda não compreendeu o que para Jesus já devia estar muito claro para os discípulos.  Há, em certo sentido, uma duplicidade na personalidade de Tommaso: ele age de uma forma e pensa de outra. Talvez seja justamente esse o primeiro significado de seu nome, que significa: gêmeo, no sentido de duplo, instável.

A última sena de Tomé no Evangelho de João é o episódio ouvido na liturgia de hoje. Depois dos acontecimentos da ressurreição de Jesus, Tomé já não está com os seus discípulos: porquê? Talvez a sua instabilidade (descrença) perante a proposta do Senhor o tenha levado a abandonar o grupo dos Doze. Não é possível seguir o Senhor no seu caminho de amor quando as motivações são fracas, baseadas apenas num entusiasmo passageiro e superficial. É precisamente isto que Jesus censura a Tomé quando lhe diz: “Não seja um incrédulo, mas um crente” (Jo 20,27). Tomé já não faz parte do grupo dos Doze depois da Ressurreição, provavelmente também porque os rostos tristes e medrosos dos seus amigos não o convencem muito. Se, de facto, fosse verdade que encontraram o Ressuscitado, talvez os seus rostos estivessem mais luminosos e sorridentes! É o problema do testemunho dos cristãos que, quando envolto em tristeza e medo, em vez de aproximar as pessoas, distancia-as.

Tomé exige ver o sinal do Senhor crucificado, ou seja, o sinal dos pregos nas mãos e nos pés e no lado rasgado pela lança e o Senhor concedê-lo. É diante desta realidade que Tomé explode ao aplicar a Jesus os atributos que a comunidade de Israel indicava apenas a YHWH: “meu Senhor e meu Deus” (Jo 20, 28). É diante dos sinais visíveis do crucifixo, do Jesus humilhado na cruz, dos inocentes mortos, que Tomé tem a certeza de ter a presença de Deus diante dos olhos! Aconteceu novamente depois dele. Até Francisco de Assis, ao ver o leproso, certamente abraçou Jesus, até Óscar Romero, bispo conservador de São Salvador, ao ver os agricultores pobres massacrados pelos ricos proprietários de terras, abraçou a sua causa e foi morto enquanto celebrava a Eucaristia. 

Também nós hoje, vendo o desastre humanitário de tantos refugiados que não sabem para onde se dirigir, vemos o Ressuscitado. E depois, na humilhação dos homossexuais, lésbicas e transexuais que são ridicularizados, insultados não só pelas pessoas comuns, mas também pela Igreja que não quer abençoar as suas uniões, está o Ressuscitado. Podemos ter a certeza de que, em cada pobreza, em cada cruz, em cada pessoa crucificada pelo orgulho e pela arrogância humana, está Jesus ressuscitado.

Esta surpreendente afirmação de Tomé, que vê Deus no crucifixo ressuscitado, significa também que na história nunca encontraremos o Ressuscitado nos quartos dos nobres, dos ricos, dos supostamente poderosos, de todos aqueles cujo estilo de vida está na origem da desigualdade na sociedade. o mundo. É, portanto, uma pista importante para todos aqueles que desejam fazer da sua vida um caminho rumo a Deus. 

A resposta de Tomás à manifestação do Ressuscitado revela também o segundo significado do seu apelido: Gêmeo. De facto, Tomé, depois do encontro com Cristo ressuscitado, torna-se um verdadeiro gémeo, querendo imitá-lo em tudo, inclusive na experiência do martírio como sinal de doação total a Ele.

 

sabato 30 marzo 2024

SÁBADO SANTO: O SILÊNCIO DO DIA TREMENDO

 





Paulo Cugini

 

Devemos ter a coragem de ouvi-la, sem subterfúgios, sem preencher significados, sem querer adoçar a todo custo. Porque não se pode adoçar o que não é doce, não se pode sorrir no dia mais triste do ano: o Sábado Santo. Nunca entendi o que há de sagrado neste dia horrendo. Como você pode, de fato, chamar de sagrado o dia mais vazio de todos, o dia do absurdo absoluto, o dia em que toda a humanidade fica sem fôlego, com a respiração suspensa. Porque toda a humanidade se levantou naquele dia sem saber a quem rezar, sem poder rezar a nenhum Deus, porque Deus havia morrido no dia anterior, barbaramente assassinado. E nem sempre dá para brincar de faz de conta, sem querer ver, sem querer ouvir. Sentimos falta de mulheres como Maria Madalena, que sabem chorar pelo seu mestre morto, que sabem sofrer intensamente sem fingir, sem esconder nada: isto é amor. Aquele amor que brota do coração e não do cálculo, aquele amor que é pura paixão e não racionalidade controlada, que calcula, que sabe fazer cálculos até com os sentimentos. E você não pode fingir que nada aconteceu e correr direto para o domingo, não pode ignorar esse dia terrível porque tem medo do escuro e fingir que nada aconteceu; você não pode fechar os olhos e os ouvidos para ir direto para a manhã de domingo. Acima de tudo, porém, o Domingo da Ressurreição não pode ser antecipado para o sábado de manhã, como infelizmente acontece muitas vezes em certas igrejas, que começam a preparar as decorações dominicais, como se não existisse o sábado de grande silêncio. Que falta de respeito!

O silêncio é necessário para ouvir o nada, para compreender o que seria o mundo sem sentido, isto é, sem Deus. O vazio deve poder penetrar no coração do homem e na consciência da mulher pelo menos uma vez na vida, para ter depois a possibilidade de pesar todas aquelas ideologias que nada mais são do que vazios disfarçados, aos quais nos agarramos para não morrer asfixiados. Obrigados a inventar significados, quando vemos a dois quilômetros de distância que não há sentido, que estamos subindo em espelhos, que estamos conversando com o vento e não temos coragem de ficar calados por medo de sentir o vazio, de sendo penetrado pelo Nada. Este é o sentido do Sábado Santo, que é santo precisamente por isso, porque nos permite tocar as cinzas da nossa vida, o nada dos nossos planos sem Deus.

Ficar suspenso no ar, pelo menos uma vez na vida, pode ser de grande ajuda para entender a quem e a que estamos vinculando nossa vida, a quem estamos nos enforcando. Rios diários de palavras inúteis para embelezar o que é naturalmente feio, o que sai mal, o que não tem forma, porque não pode ter forma, porque estamos apenas dando a eles. Bastaria um dia ter coragem de percorrer os locais onde acontecem os encontros entre adultos, ou seja, pelo menos uma vez na vida você teria que ficar mais de duas horas num bar, na padaria, no mercado e ouvir, prestar atenção, abrir bem os ouvidos para o que se diz, para o nada que se discute durante horas e horas. Falamos sobre o que somos e o que fazemos, onde o fazer é forçado a substituir o nada do nosso ser.

 É por isso que lutamos para ficar em silêncio no Sábado Santo, lutamos para compreender a profundidade do vazio criado pela ausência de Deus no mundo, porque esse vazio, esse silêncio é revelador, esse vazio daquele dia terrível revela o vazio que nós temos dentro de nós e que vamos cultivando aos poucos em cada momento do nosso dia. Porque a vida não tem um sentido externo, não tem significados que possamos tirar de fora, porque todo sentido atribuído de fora ou elaborado pela nossa mente não corresponde à realidade das coisas e é, portanto, pura ideologia e a ideologia é uma ficção, um exagero, um absurdo disfarçado de sentido. É por isso que a ideologia não nos preenche, porque é falsa e toda falsidade nos afasta da realidade e quanto mais aumenta a distância da realidade, aumenta ao mesmo tempo a distância com a verdade. E assim, permanecemos neste processo ideológico que com o tempo nos esvazia, nos torna falsos, nos faz avançar continuamente, porque já não somos capazes, já não somos capazes de captar o momento, a verdade, o autêntico. O sentido das coisas vem de dentro do mundo, de dentro do homem, do seu coração. Apreendemo-lo quando estamos em silêncio, quando entramos em nós mesmos, percebemos nestes momentos que o sentido da vida, o sentido profundo da existência não pode vir da matéria, não pode ser algo material, temporal, acidental.

Deve haver algo mais, mais duradouro, mais verdadeiro e profundo. Talvez este seja um dos dons mais profundos do dia terrível, daquele dia cheio de desespero que é o Sábado Santo. É, de facto, neste dia que podemos tocar em primeira mão o nada da matéria, o nada de todos os pensamentos vazios quando são ditados pela pressa de preencher de sentido o que não tem sentido. É neste dia tremendo que descobrimos a saudade de Deus, o desejo do seu amor, a beleza de estar com Ele, o sentido que Ele e só Ele pode dar à vida em todos os seus aspectos. É a partir do tremendo dia do Sábado Santo que, ao pôr do sol, podemos ver a luz radiante da madrugada do domingo, do dia mais radiante e luminoso do ano: o Domingo da Ressurreição do Senhor.

venerdì 29 marzo 2024

E ELE VIU E ACREDITOU: A PÁSCOA DO SENHOR!

 




DOMINGO DE PÁSCOA/B

(Atos 10, 34a. 37-43; Col 3,1-4; Jo 20,1-9)

Paulo Cugini

 

A Semana Santa, com as suas liturgias repletas de memórias significativas dos últimos momentos cruciais da vida de Jesus, deve ter aberto os nossos corações e as nossas mentes à novidade que o Senhor traz com a sua ressurreição. Na verdade, passamos do nível da história ao nível da fé. Não é por acaso que na primeira leitura Pedro nos adverte que Jesus apareceu depois da sua ressurreição apenas “a nós que comemos e bebemos com ele depois da sua ressurreição dentre os mortos ” (Atos 10, 41). É, portanto, aos discípulos e às discípulas que Jesus aparece depois da sua ressurreição e não a todas as pessoas, como fez quando estava vivo. É uma indicação, a meu ver, importante, porque revela que para entrar no mistério da ressurreição de Jesus precisamos sair de um caminho, movidos pelo desejo de conhecer o Senhor, que nos ajuda a fazer escolhas, que nos orientam decididamente para Ele. É como se Jesus, num certo sentido, quisesse separar-nos, isolar-nos, encontrar-nos. Esta nova presença de Jesus na história exige um novo tipo de conhecimento, que nos permita perceber a sua presença captando pistas, interpretando ausências, que falam de uma passagem, de uma presença, de um estilo, de um modo de ser.

Neste caminho de percepção de Cristo ressuscitado, o Evangelho de hoje oferece-nos algumas reflexões significativas. Qual é o significado daquela corrida de Maria Madalena, de Pedro e do discípulo que Jesus amava? A primeira cena da ressurreição narrada por João é caracterizada por uma busca num lugar onde Jesus não pode estar e que, posteriormente, gera uma série de movimentos rápidos e corridos. Há uma busca e um movimento rápido, que revela um profundo sentimento de amor por parte dos discípulos para com Jesus, revelando a profundidade dos vínculos que em pouco tempo Jesus conseguiu estabelecer com aqueles que o seguiam. A de Jesus foi uma presença preenchedora, que deu sentido às coisas, aos gestos, às escolhas. A experiência do grupo de discípulos é caracterizada pelo contato diário com Jesus, pelos gestos diários, pela partilha de tudo com Ele todos os dias. Isto diz muito sobre o significado da comunidade cristã, que não pode ser relegada a algum ritual semanal ou a algum evento durante o ano. Há uma humanidade que deve ser envolvida, há contatos humanos diários, que falam da verdade de um caminho de fé. A falta de Jesus gera naqueles que conviveram com ele um profundo sentimento de perplexidade, desespero e por isso o procuram e a percepção de que seu corpo não está onde um olhar humano imaginava que estivesse, gera pânico, um anúncio: “Eles tiraram o Senhor do túmulo ” (Jo 20, 2), que traduzido significa: “quem está vivo não pode ser procurado entre os mortos ” (ver Lucas 24,5). A partir de agora, a procura de Jesus, o estar com Ele, deverá ser abordada de forma diferente e deverá basear-se numa nova forma de relacionamento.

Na segunda parte do Evangelho de hoje, chama a atenção que Pedro e João vejam as mesmas coisas, mas só de João se diz que: “viu e acreditou” (Jo 20,8). Há, portanto, um ver que não provoca a fé em Cristo ressuscitado e um ver que, ao contrário, abre os olhos para a presença nova de Jesus. A partir das narrativas dos Evangelhos percebemos traços das personalidades e intenções dos discípulos. Assim, se Pedro provavelmente seguiu Jesus pelo que ele poderia representar no processo de libertação do povo de Israel da presença dos romanos, João, por sua vez, ficou fascinado pela personalidade de Jesus e sentiu um carinho fraterno por ele, a ponto de estar atento aos mínimos detalhes. Por isso, ao entrar no sepulcro vazio e ver “os panos ali postos e o sudário – que estava sobre a sua cabeça – não colocados ali com os panos, mas embrulhados num lugar separado” (Jo 20, 6-7), Pedro não “vê” nada em particular, enquanto João entende que aquela forma de colocar os panos e o sudário era típica de Jesus e, por isso, reconhece os sinais da sua presença, da sua passagem.

A Páscoa de Jesus nos diz que o conhecimento Dele vem através de detalhes, pistas que só podem ser reconhecidas por quem se dedica a Ele, que está voluntariamente com o Senhor, que gosta de ouvir a Sua Palavra porque está aí mesmo o primeiro indício de a sua presença misteriosa: “ ainda não tinham compreendido a Escritura, que era necessário que ele ressuscitasse dentre os mortos ” (Jo 20,9). Queremos encontrar o Ressuscitado? Vamos começar a ler as Escrituras!

 

mercoledì 27 marzo 2024

HOMILIA DA QUINTA-FEIRA SANTA 2024

 

 


 

JESUS ​​​​SABIA

Paulo Cugini

 

“Jesus sabendo...” (Jo 13,1). Iniciamos o Tríduo Pascal com a percepção que Jesus tem do seu próprio caminho e este pequeno versículo deve ajudar-nos a desmantelar na nossa alma aquele ensinamento tipicamente devocional e nada evangélico, que vê o Pai oferecendo o seu Filho como sacrifício pela nossa salvação.  Nada disto aparece no Evangelho de hoje, mas sim a percepção de um homem que tem plena consciência das suas próprias escolhas e está disposto a pagar por isso. O que é que Jesus sabe? Ele tem plena consciência de que a sua posição contra as tradições religiosas, contra os líderes religiosos do povo que não compreendem o ponto de vista de Jesus, a sua escolha de encarnar as profecias do messias portador da paz e da justiça e de não ser o ponto de referência das expectativas políticas revolucionárias, terá consequências graves e pelas quais, precisamente nessas horas, ele terá de pagar. É Jesus quem se entrega livremente à sua paixão (a segunda oração eucarística também o diz) e o faz por amor ao seu Pai, por amor aos seus discípulos. “Tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até ao fim ” (Jo 13,1). Isto significa que os últimos dias da vida pública de Jesus, antes de serem um drama, são uma bela história de amor, fruto das escolhas livres de um homem livre, que mostrou o caminho de uma vida autêntica, com gestos e escolhas concretas e, precisamente por isso as suas palavras eram compreensíveis, porque eram visíveis no seu estilo de vida.

“Jesus sabendo que o Pai tinha entregado tudo em suas mãos e que viera de Deus e para Deus voltaria” (Jo 13,3). Mistério do conhecimento de Jesus sobre o caminho de sua vida. Há esta insistência no conhecimento de Jesus e, neste caso, num segundo nível de percepção. Portanto, não só Jesus se entrega gratuitamente, mas também sabe muito bem de onde vem e conhece o poder que Deus colocou em suas mãos. Que poder é esse? O poder da vida verdadeira, que só pode gerar amor em quem a acolhe. Foi isso que Jesus fez durante a sua vida, amando sem medida, devolvendo a dignidade a quem a havia perdido, abraçando os leprosos, valorizando quem foi humilhado. É o poder de quem não precisa provar nada ao mundo, porque sente que a sua dignidade depende exclusivamente do olhar do Pai. Pois bem, com a consciência no coração de ter recebido tudo do Pai, levanta-se da mesa e lava os pés dos seus discípulos. É como se Jesus quisesse esconder este poder do Pai no pequeno gesto de serviço à sua irmã, ao seu irmão. Cada vez que nos dobramos, que nos colocamos ao serviço dos outros, entramos em contacto com o poder de Deus, que é amor, vida autêntica, que, nestas situações, vivemos e que nos enche desproporcionalmente o coração.

“Você entende o que eu fiz por você?” (Jo 13, 12). Jesus nada faz por si mesmo e, assim, ensina-nos que é precisamente vivendo para os outros que fazemos algo por nós mesmos, que realizamos a nossa natureza humana, que é feita para amar e amar significa ir ao encontro do outro. um livre e desinteressado. É por isso que a Eucaristia que celebramos todos os domingos é o símbolo da vida de Jesus que queremos assimilar para que também se torne nossa: um corpo partido e um sangue derramado por nós. É o Espírito Santo que recebemos que deve poder operar em nós, formando uma humanidade capaz de sair finalmente da estreita vida individualista, de caminhar em direção aos outros, de acolher quem aparece no nosso horizonte, tal como ele fez e continua a fazer Jesus com cada um de nós.

 

lunedì 18 marzo 2024

DOMINGO DOS RAMOS/B

 




O SENHOR DEUS ABRIU MEU OUVIDO

(Is 50, 4-7; Fil 2, 6-11; Mc 11, 1-11 e  Mc 14-15)

Paulo Cugini

 

Com o Domingo de Ramos entramos na Semana Santa, durante a qual somos convidados a refletir sobre o mistério da paixão de Jesus, da sua morte e ressurreição. São dias intensos que, se nós nos deixarmos envolver, deixarão sem dúvida a sua marca no nosso caminho de fé e, em geral, na nossa vida. Acompanhando as leituras que ouviremos, poderemos aprender lições e chaves de leituras que podem nos ajudar ao longo da semana.

O Senhor Deus abriu-me os ouvidos e não resisti” (Is 50, 5). A letra do terceiro cântico do servo, que encontramos na segunda parte do livro do profeta Isaías, nos dá um personagem que, em vários aspectos, antecipa vários traços daquilo que veremos em Jesus. que se sente chamado por Deus para consolar os desanimados, com aquela Palavra que ouve pela manhã. O servo tem a clara percepção de que a possibilidade de compreender a Palavra é obra do Senhor, palavra que gera dissensão entre aqueles que a recebem, a ponto de colocar em risco a própria vida do servo de YHWH. A relação profunda com o Pai permite ao servo do Senhor enfrentar situações de conflito e não se intimidar. Levar uma palavra de amor e de justiça, num mundo conflituoso e cheio de ódio e injustiça, só pode causar tensões e incompreensões que, se não forem vividas constantemente no horizonte da relação com o Pai, correm o risco de nos esmagar e de nos ferir, colocando-nos em perigo.

“Ele se esvaziou assumindo a forma de servo” (Fl 2,7). É a resposta de Jesus à arrogância do mundo, ao orgulho típico daquela humanidade que pensa já saber tudo e se coloca na atitude de ter que ensinar os outros. Jesus responde baixando as armas, despojando-se de tudo, de qualquer elemento que pudesse temer a grandeza e, desta forma, afasta qualquer possibilidade de argumentação arrogante, porque Ele vem ao mundo como um servo disponível para servir, como então o fará. na última ceia, lavando os pés dos seus discípulos. Ele repetirá durante toda a vida que o modo de estar no mundo dos discípulos não é parecer maior que os outros, mas fazer-se pequeno, humilhar-se, como fez Aquele que, sendo rico, se fez pobre (ver 2Cor 8,9) e “mesmo estando na condição de Deus, não considerou ser como Deus um privilégio, mas esvaziou-se a si mesmo” (Fl 2,6). Jesus veio para inaugurar novas relações, uma nova forma de estar no mundo, de entrar em contato com os outros, não mais medida pela força, pela vontade de poder, mas por aquela liberdade que vem de um coração rico e cheio de amor. “Por isso Deus o exaltou” (Fl 2, 9) porque se humilhou, humilhou-se, para poder chegar a todos. Com seu estilo, Jesus criou espaço para que todos se sentissem à vontade e nos explicou com seu exemplo que relacionamentos fundados no amor de Deus exigem humilhação, humildade e delicadeza.

Foram e encontraram o burro perto de uma porta” (Mc 11, 4). É este novo estilo de Jesus que tem criado consternação, dissensão, preocupação, porque daquele que se afirma Filho de Deus, o messias esperado e, portanto, alguém importante, esperamos ações e palavras que justifiquem a suposta grandeza. E, em vez disso, Jesus segue o caminho oposto. Ele não montou um cavalo para entrar em Jerusalém, como sempre fizeram todos os reis que se prezam, mas entrou montado num burro, como fazem os servos. Jesus encarna plenamente o messias que veio estabelecer um reino de paz, para transformar as armas em ferramentas para trabalhar os campos, para arar e semear, tal como disseram alguns profetas (cf. Zc 9,9; Is 11,4). E assim, Jesus entrando em Jerusalém desta forma confirma as suas escolhas e distancia-se definitivamente de todos aqueles que lhe exigiam que encarnasse as expectativas de uma parte do povo, que exigia um messias forte, capaz de liderar o exército contra os romanos e alcançar assim a libertação de Israel. Jesus, porém, encarnando as profecias que anunciavam a vinda de um rei de paz, torna-se protagonista de uma libertação muito mais profunda, capaz de mudar a história a partir de dentro, como o grão de trigo que, morrendo na terra, produz muitos frutos. 

sabato 16 marzo 2024

V DOMINGO DA QUARESMA/B

 



NOVA ALIANÇA


Jr 31,31-34; Hb 5,7-9; João 12, 20-33

Paulo Cugini

 

     Aproximamo-nos da Páscoa e a liturgia da Palavra dá-nos um vislumbre do sentido deste caminho espiritual que, ao mesmo tempo, é um caminho de humanização. Jesus é a nova aliança profetizada por Jeremias, é a luz nas trevas da noite, é o grão de trigo que morreu para nos dar vida. Podemos compreender esta novidade libertando-nos das nossas tentativas de autossalvação, deixando que o Espírito Santo nos toque no fundo da nossa consciência.

“Porei a minha lei no seu interior, e a escreverei nos seus corações ” (Jr 31, 33). Numa época, a do século VI a.C., em que a Palestina estava ameaçada por todos os lados - Egipto pelo Sul e Nabucodonosor pelo Noroeste - e era perceptível a ruína iminente, que, como sabemos, acontecerá a partir de 587 a.C, o profeta tenta ajudar o povo convidando-o a olhar para outro lugar, para além da destruição iminente. Se é verdade que a Antiga Aliança não funcionou, a ponto de os sábios de Israel interpretarem os acontecimentos de destruição social como consequência da desobediência do Povo às leis que Deus havia confiado a Moisés, é igualmente verdade que este fracasso não é simplesmente um sinal de um fracasso histórico sem retorno, mas torna-se espaço para uma nova possibilidade de vida. Jeremias encoraja o povo de Israel mostrando-lhe uma nova perspectiva, um novo modo que Deus escolheu para revelar a sua palavra de amor, que orienta as pessoas para uma vida mais autêntica. Há, portanto, uma iniciativa de Deus que intervém surpreendentemente na história, não para condenar a humanidade, mas para envolvê-la na sua infinita misericórdia: « Perdoarei a sua iniquidade e não me lembrarei mais dos seus pecados » (Jr 31, 34). É nesta nova aliança de amor que as pessoas são chamadas a repensar-se e a redescobrir uma nova forma de estar no mundo. Este modo de proceder de Deus manifestado pelo profeta Jeremias contém, na minha opinião, um grande ensinamento para a comunidade cristã. Em situações difíceis em vez de perder tempo a queixar-se e a pensar nos tempos passados, a comunidade cristã é chamada a pensar algo novo, a implementar novas estratégias. As leituras de hoje ensinam-nos que, neste esforço de criatividade, não estamos sozinhos porque podemos recorrer aos conteúdos que o Espírito derramou em nós, nas nossas consciências e que estão apenas à espera de serem invocados.

Se o grão de trigo não morre fica só, mas se morre produz muito fruto” (Jo 12.24). Se quiséssemos dar um nome, um rosto à Nova Aliança anunciada pelo profeta Jeremias, só podemos mencionar o nome de Jesus: na verdade, Ele é a Nova Aliança, é o seu modo de viver por amor, que quebra o estilo de vida baseado no egoísmo, é a sua doação desinteressada que rompe os padrões meritocráticos tão presentes também na vida das comunidades cristãs. Só podemos ir ao encontro do outro de forma desinteressada e livre seguindo o exemplo de Jesus, se nos encontrarmos num caminho de transformação, de relação constante com o Senhor, que nos despoja progressivamente dos resíduos do nosso egoísmo. É o Senhor quem nos salva do nosso destino de solidão, produzido pela tentativa de realizar a nossa vida confiando apenas nas nossas próprias forças, o que nos leva a ver os outros não como irmãos e irmãs, mas como inimigos a combater. Um mundo novo é possível quando aprendemos a ser visionários como o profeta Jeremias, que viu novos caminhos onde o povo só via lágrimas e desespero. Quanto a Jesus cuja hora de manifestação da sua glória se realiza na cruz, sinal do seu imenso amor para com o Pai, assim também para nós quando despojados do nosso egoísmo vivemos intensamente a vida fraterna, manifestando assim a nova aliança que é a vida de Cristo entre nós. Isto é o que o mundo precisa ver para acreditar no Senhor: novas mulheres e homens que já não vivem para si mesmos, mas que escolhem viver uma vida de doação gratuita por amor.

 

giovedì 29 febbraio 2024

TERCEIRO DOMINGO DA QUARESMA/B

 




 

Paulo Cugini

 

No Caminho que a liturgia nos propõe neste tempo de Quaresma, caminho no qual somos convidados a dar espaço ao Evangelho e à sua proposta de amor e de justiça, no terceiro domingo somos convidados a verificar a nossa relação com a religião. De que religião viemos? Esta é a pergunta que a liturgia atual parece nos fazer. Não só isso, mas ao mesmo tempo que nos questionamos sobre o Deus em que acreditamos, também somos chamados a avaliar a nossa forma de estar no mundo, a compreender que relação temos com a criação. 

“Tirem daqui estas coisas e não façam da casa de meu Pai um mercado” (Jo 2, 16).

Jesus mostra-nos que o rosto de Deus é o rosto do Pai e, por isso, há proximidade. Teria gostado de encontrar no templo um ambiente de proximidade ao Pai, um ambiente de relação filial, e em vez disso encontra um mercado com comerciantes, sinal de um processo de degradação que o templo viveu, a ponto de não mesmo percebendo isso. Este é, sem dúvida, um aspecto do problema. Quando se perde o contato com o conteúdo da revelação, a matéria vai assimilando e incorporando progressivamente também o que é espiritual e, neste caso, a vida do templo, a ponto de levar a pensar que o templo se identifica com o mercado, com o negócio. Talvez este seja um dos danos mais graves que a vida religiosa, desligada das suas origens, pode causar no coração das pessoas, perdendo de vista a finalidade da relação com o Pai. Em Jesus, o Pai aproximou-se de cada pessoa e, consequentemente, já não há necessidade de oferecer sacrifícios ou de fazer sacrifícios (os famosos pequenos sacrifícios!), mas de seguir o seu exemplo, entregando gratuitamente a nossa vida aos nossos irmãos e a as irmãs que encontramos, especialmente as mais frágeis e as excluídas da religião. Ao fazer morada entre nós (Jo 1,14) Jesus inicia o processo de dessacralização da religião, mostrando que a partir de agora tudo é sagrado, porque tudo foi criado pelo Pai, que deseja uma relação de proximidade com Ele Os ritos e liturgias deveria, portanto, exprimir o sinal desta proximidade e, ao mesmo tempo, demonstrar um novo modo de estar no mundo, não mais marcado pelos jogos de interesses, mas pelo amor gratuito, pelo serviço desinteressado.

“Ele falou do templo do seu corpo” (Jo 2,21).

É difícil compreender a profundidade das palavras de Jesus, sobretudo porque surgem no contexto de uma cultura e de uma religião que durante séculos desprezou o corpo, considerando-o um obstáculo à vida espiritual, por ser sede de paixões, emoções, o que pode distrair quem busca a intimidade com Deus. Jesus inverte completamente a perspectiva ao afirmar que o corpo não só não impede o encontro com Deus, mas o facilita, porque o corpo é o santuário do Espírito. Relegar a possibilidade de encontro com Deus a um único lugar fechado feito de pedras significa limitar severamente o encontro das pessoas com Deus e abrir a porta para o controle incondicional de alguém sobre a esfera do divino. Até Paulo, na sua carta aos Coríntios, chega ao ponto de afirmar que: “Não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo que está em vós?” (1 Cor 6, 19). Existem contaminações culturais ou religiosas que, à distância, são avaliadas como positivas, porque abrem a discussão para horizontes novos e inexplorados; e há contaminações que são nocivas, porque desfiguram a mensagem evangélica, inserindo conteúdos negativos numa mensagem puramente positiva. Um desses encontros que prejudicou a proposta do Evangelho diz respeito à perspectiva antropológica do platonismo, que se infiltrou no cristianismo que, sem pensar muito, desenvolveu ao longo dos séculos seguintes uma visão negativa do corpo e da sexualidade totalmente estranha à perspectiva aberta por Jesus: O corpo como templo do Espírito significa a máxima valorização da vida pessoal e comunitária, porque é com o corpo que nos relacionamos com os outros, com a natureza, com o cosmos. É nesta linha que é possível desenvolver uma espiritualidade positiva da criação, da harmonia do homem e da mulher com a natureza circundante, aspectos raramente desenvolvidos pela espiritualidade católica. Neste tempo de Quaresma somos, portanto, chamados a avaliar não só a nossa relação com a criação, mas também e sobretudo no contexto sócio-político em que vivemos, o nosso contributo para a criação de um mundo saudável, atento à natureza, respeitoso da todos os aspectos da vida, colaboradores de uma construção harmoniosa da criação em que tudo se relaciona com tudo.

 

ESTUDO BÍBLICO EVANGELHO DE MARCOS CAPÍTULO 3

 


lunedì 19 febbraio 2024

SEGUNDO DOMINGO DA QUARESMA B

 





Gn 22, 1-2. 9. 10-13. 15h às 18h; Rm 8, 31-34; Mc 9, 1-9

Paulo Cugini

 

É interessante observar a pedagogia da proposta litúrgica da Quaresma. Pouco depois do início do caminho que, para quem o vive, é desafiante, porque envolve estar disponível para mudar a visão das coisas, o ponto de vista sobre Deus e o mundo, é proposto um tema que antecipa o que será: a conclusão do caminho quaresmal, ou seja, a Páscoa do Senhor, a sua morte e ressurreição. O Evangelho da transfiguração do Senhor, de facto, antecipa o tema da ressurreição, ajudando os fiéis a terem coragem, porque o que esperamos não é simplesmente uma utopia, mas já foi alcançado, já é um facto que a fé encoraja você a acreditar. Procuremos, então, acompanhar a narrativa do Evangelho para captar indicações para o nosso caminho de fé.

“Ele foi transfigurado diante deles” (Mc 9, 2). Este acontecimento relatado por todos os sinópticos apresenta-nos um fato que exige uma revisão do nosso modo de nos aproximarmos de Jesus: a sua transfiguração na montanha, de facto, significa que já não nos podemos permitir ir em direção a Jesus como vamos em direção a um qualquer homem: aqui há algo diferente, que não pode ser explicado apenas com dados humanos, com dados que nos chegam da matéria, com raciocínio lógico. “Nenhuma lavadeira na terra poderia torná-los tão brancos”: é uma forma ingénua mas autêntica de comunicar a natureza extraordinária do acontecimento. A pessoa de Jesus escapa a uma análise simplesmente humana: é preciso algo mais para compreendê-la, são necessários outros parâmetros, que não estão ao simples alcance do homem e da mulher. Para compreender quem é Jesus, precisamos ir a outro lugar, empreender um caminho de investigação, mas, sobretudo, deixar-nos conduzir ao mistério de Deus.

“Elias e Moisés apareceram-lhes e conversavam com Jesus.” O primeiro passo para uma melhor compreensão da pessoa de Jesus deveria ser o conhecimento da história de onde Ele provém, a história do povo judeu, as alianças com YHWH, a voz dos profetas, como a de Elias. Se, de facto, é verdade que a transfiguração fala de uma pessoa que escapa à mera lógica humana, está, no entanto, fora de questão que Jesus seja membro de um povo, filho de uma mulher, parte de uma história de homens e mulherers, o que é importante saber. Jesus como cumprimento das promessas indica precisamente a necessidade de fazer um retrocesso, um caminho em busca de um passado que se espalhe no presente de Jesus, nas suas escolhas e nos seus gestos.

Saiu uma voz: este é o meu Filho amado: escutai-o”. O tempo da Quaresma deveria ser uma oportunidade favorável para sair da religião ancestral, que está misturada com resíduos pagãos, aquela religião que coloca o sujeito e as suas necessidades no centro e Deus, nesta perspectiva, deveria ser um mero distribuidor de favores. Viagem quaresmal para redefinir a nossa relação com o divino, a nossa relação com Jesus: é a Ele que devemos escutar e não o nosso ventre. Vamos, portanto, caminhar em direção a Ele em silêncio, abrindo espaço para Ele, para senti-lo presente, para ouvi-lo. “Escutai-o”: esta palavra do Pai sobre o Filho é uma grande indicação para renovar a nossa oração: o ponto de partida não são as nossas palavras, mas a sua Palavra: partimos daqui.

Se perguntando o que significava ressuscitar dos mortos.” O problema dos discípulos que não entendem o que Jesus quer dizer-lhes é o nosso problema, que permanece assim até que ocorra uma conversão, uma abertura do coração a trezentos e sessenta graus, um renascimento do alto. O caminho quaresmal é, portanto, o tempo propício para dar lugar à novidade de Jesus, que é como o vinho novo que exige odres novos, é a semente que necessita de solo fértil, é a lâmpada que ilumina a noite.

giovedì 15 febbraio 2024

O QUARTO CANTO DO SERVO DE YHWH (Is 32,13-53, 12)

 








Paolo Cugini

É impressionante a semelhança entre o quarto canto do Servo e o que aconteceu com Jesus.

“Eis que o meu Servo terá sucesso …” Aqui estão os verbos que o NT usa para falar da ressurreição, que é uma ressurreição, é uma posição, restabelecida, glorificada. Com duplo sentido porque a elevação significa uma vantagem. No Evangelho de Marcos a única profissão de fé será feita por um centurião romano e pagão debaixo da cruz, um homem que não conheceu Jesus. É na cruz que se abre o caminho para o Reino: hoje você estará comigo no paraíso (ver Lucas 22).

“Muitos ficaram maravilhados com ele, sua aparência estava tão desfigurada.” É uma morte que serve para a salvação de todos. Algo chocante aconteceu. Algo que não seja glamoroso. Jesus sofreu duas sentenças de morte, porque a flagelação para os romanos era uma sentença de morte. Os cristãos levaram três séculos para desenhar a cruz. O salmo diz: ele é o mais belo dos filhos do homem. Pilatos diz: Ecce homo. Este é o paradoxo. Onde está essa beleza? É uma beleza que não seduz. Ele não é alguém que te compra com beleza aparente, com seu charme. Ele não é um manipulador. Trata-se de captar a beleza que aparece se você a procurar profundamente e percebê-la a partir da profundidade de suas escolhas. É a beleza de quem não cede ao mal. Jesus mostra-te o custo do amor: esta é a verdadeira beleza que te converte.

A cruz é o nosso espelho. Esse homem desfigurado é a minha imagem ferida pelo pecado. Todo o mal do mundo é representado pelos personagens que cercam Jesus naquelas horas em que descarregam sobre ele o que não querem ver. O crucifixo é o que acontece no pecado do homem. O inocente Jesus leva os pecados do mundo. Jesus escolhe a mansidão para que a violência que está sobre ele seja clara. O homem desfigurado é o servo do Senhor que se torna espelho da minha feiura. Mas aquele homem desfigurado é também espelho do amor paciente e profundo do Deus que é capaz de carregar o peso dos outros. A cruz é a narrativa de quão profundo é o amor de Deus. Jesus é a esponja contra a qual você pode liberar sua raiva e receber o perdão. Deus não é sanguinário, mas a salvação é conhecer a face de Deus e a minha. O Servo assume esta missão de libertação. A mansidão é saber permanecer com força nessa posição será a libertação da violência do mundo.

A realidade muda no momento em que reconhecemos nossos pecados. Em todos os Evangelhos Pedro não se envergonha de dizer o que fez a Jesus, porque está perdoado. Jeremias dirá: quando os seus pecados forem perdoados você conhecerá a Deus.