sabato 17 agosto 2024

XXI DOMINGO/B

 




(Js 24, 1-18; Sl 33; Ef 5, 21-32; Jo 6, 60-69)

Paulo Cugini

 

      A incompreensão daquilo que Jesus diz aos seus discípulos é o tema do Evangelho de hoje. Um mal-entendido que vem de longe, da dificuldade de dar o salto de qualidade que Jesus propõe, ou seja, de olhar a realidade a partir da dimensão espiritual e interior e abandonar uma visão materialista e instintiva da história. É um caminho fascinante mas, ao mesmo tempo, difícil porque exige uma mudança de mentalidade, de paradigma e de estilo de vida, que só é possível para quem responde pessoalmente ao chamamento do Senhor.

Esta palavra é dura! Quem pode ouvir isso?

Por que a Palavra de Jesus é dura? Existem várias respostas que podem ser dadas. A primeira, a mais simples, refere-se às palavras que precedem o Evangelho de hoje, quando afirmava que: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna”. Há, portanto, uma resistência ao conteúdo literal das palavras usadas por Jesus que, como sabemos, devem ser interpretadas. A carne e o sangue de Jesus são a sua palavra, o seu estilo de vida, que deve ser “comido”, no sentido de assimilar, para que influencie as escolhas quotidianas. Em segundo lugar, é uma discussão dura porque é radical e não permite alternativas. Jesus coloca os seus discípulos e discipulas contra a parede: só existe um caminho que permite entrar agora na vida eterna, e é o caminho proposto pelo Senhor. Isto significa que é preciso escolher e, ao escolher o Senhor, significa abandonar outros caminhos. Depois, há um terceiro nível para o qual o discurso de Jesus parece duro e é a sua reviravolta da perspectiva religiosa clássica. Neste último sentido, de facto, propõe-se sacrificar a vida presente em vista de uma recompensa futura. Para Jesus, porém, a vida eterna começa agora, no momento em que a pessoa adere à sua palavra, a assimila, a “come”, tem a vida eterna, no sentido de que os sinais da eternidade, que são o amor, a gratuidade da vida, a capacidade de perdoar e de ser pessoas misericordiosas começa agora. Este discurso é claramente assustador e difícil para todos os religiosos habituados a guardar méritos para depois, um sistema religioso que permite às pessoas permanecerem quem são, cuidarem da sua vida e apostarem a sua religiosidade, a possibilidade de vida eterna após a morte. Jesus não está interessado em nossas aparências religiosas, que nos tornam belos diante do mundo, mas sim hipócritas diante de Deus.

É o Espírito que dá vida, a carne não serve para nada; as palavras que te falei são espírito e são vida.

     A carne é a vida guiada pela parte instintiva e material da existência e não consegue orientá-la para o amor autêntico, desinteressado e gratuito. A carne orienta a existência para a posse dos outros e das coisas, porque centra a existência humana nos seus próprios interesses. Carne significa egoísmo, alimentado pelo instinto de sobrevivência, que reduz tudo a si mesmo, até mesmo as relações interpessoais. Por isso, para seguir Jesus, para compreender a sua palavra, que nos conduz a um estilo de vida sóbrio, atento aos outros, esquecido de nós mesmos, precisamos fazer escolhas que orientem a nossa existência para o espírito, para a vida interior, para que é ela que guia a nossa carne e não o contrário.

A partir daquele momento muitos dos seus discípulos voltaram atrás e já não o acompanhavam.
Jesus disse então aos Doze: Vocês também querem ir embora?

    A pedagogia de Jesus é interessante: diante da decepção e do abandono de muitos dos seus discípulos, ele não recua, não baixa a guarda, sobretudo, não dilui a sua mensagem tornando-a mais doce e agradável. Ele sabe muito bem que o seu discurso é radical e que muitos dos seus discípulos e discipulas não o compreendem. Os riscos são, no entanto, elevados. Há um novo estilo de vida autêntica que Jesus inaugurou, que manifesta a imagem de Deus com a qual fomos criados e que o nosso egoísmo obscurece. Por isso, Jesus não diminui a força do seu anúncio, porque não procura o número de seguidores, mas aqueles que o Pai chama e que Ele verifica a sua resposta.

Simão Pedro respondeu-lhe: «Senhor, para quem iremos? Você tem palavras de vida eterna e nós acreditamos e sabemos que você é o Santo de Deus

     A simpática resposta de Pietro tem um aspecto positivo e outro negativo. Positivo é o entusiasmo com que Pedro reconhece o facto de um grupo de homens e mulheres terem escolhido segui-lo e, para isso, terem virado a sua vida de cabeça para baixo e ainda estarem dispostos a segui-lo porque reconhecem a bondade da sua proposta. Negativa é a expressão escolhida por Pedro para apontar a identidade de Jesus: o santo de Deus. É, na verdade, um título messiânico que se refere ao messianismo davídico, que vê no futuro messias um rei poderoso que derrotará o inimigo,  neste caso os romanos, o messias que veio a dominar os pagãos, para impor a lei mosaica. É exatamente a expressão que o homem possuído pelo demônio usava, sempre em Cafarnaum e sempre na sinagoga, como lemos em Marcos 4, 31-37. Nada disso pretende ser Jesus, como vimos. A resposta de Pedro abre questões perturbadoras sobre o futuro da viagem que Jesus fará com os seus discípulos até Jerusalém. 

 


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