(Is 50,5-9a; Sl 115,1-2.3-4.5-6.8-9; Tg 2,14-18; Mc
8,27-35)
Paulo Cugini
É lindo ver Jesus caminhando
com os seus discípulos pelas ruas da Galileia: revela muitas coisas sobre o
sentido que Ele quis dar à sua missão. Em primeiro lugar, a precariedade. Ele
estava tão cheio do amor do Pai que não precisava procurar outras fontes de
satisfação. E depois muita liberdade que lhe permite andar junto com os seus
discípulos sem ter que se preocupar com o que comer, o que vestir e mais nada.
Precariedade e liberdade andam de mãos dadas.
“Quem as pessoas dizem que eu sou?”. É uma questão importante, não só porque na narrativa
de Marcos estamos a meio caminho da vida pública de Jesus, mas também porque a
vida dos discípulos deve ser uma resposta à Palavra de Jesus. Portanto, captar
a essência da sua mensagem é. fundamental para a existência.
“João Batista; outros dizem
Elias e outros um dos profetas”. A descoberta de Jesus é amarga, porque encontra um povo ainda ancorado
no passado, nas suas próprias histórias e tradições. Elias e os profetas foram,
sem dúvida, grandes figuras do passado, que tiveram um papel importante na
história do povo de Israel, mas nada revelam do presente que Jesus veio trazer.
O próprio João Batista, considerado o maior dos profetas por ter podido ver e
conhecer Jesus, ainda permanece ancorado no Antigo Testamento. A resposta de
Pedro também vem do passado. Na verdade, ao dizer “Tu és o Cristo”,
ele não passa das projeções do passado para o presente. Cristo, de facto, é o
título atribuído ao futuro messias, o ungido de Deus. Jesus descobre, portanto,
que, apesar das suas palavras e obras, ninguém compreende a novidade da sua
mensagem. Jesus descobre que até agora não houve nenhum esforço para
compreender o que realmente está acontecendo com a sua vinda, mas todas as suas
palavras e ações são derramadas em odres velhos.
O que esses versículos
significam? Revelam-nos algo muito profundo nos homens e nas mulheres,
nomeadamente a dificuldade de abertura ao novo. É como se o presente estivesse
obstruído pelo passado, como se a consciência identificasse a reprodução do
passado, de alguns momentos significativos, como a felicidade da vida.
Preencher o presente com o passado, adoçando-o, é um mecanismo que surge do
instinto de sobrevivência, que leva ao apego ao que dá segurança.
O primeiro passo, portanto,
num caminho de conversão, que nos permite captar a novidade da proposta de
Jesus, consiste em libertar-nos dos desperdícios do passado, que obstruem
pesadamente o nosso presente. Existe uma surdez psicológica e existencial, que
não nos permite apreender a novidade do presente e que se desenvolve
precisamente quando a pessoa se apega progressivamente ao
passado, às tradições do lugar onde vive, que ainda permanecem humanas
tradições.
E começou a ensinar-lhes que o Filho do homem devia
sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos principais sacerdotes e pelos
escribas, ser morto e, depois de três dias, ressuscitar.
A incapacidade de nos
libertarmos do passado não nos permite compreender o sentido profundo da vida
que Jesus veio manifestar. Seguir Jesus, abraçar a novidade da sua Palavra,
significa entrar no caminho do amor, da busca da justiça, que se manifesta como
misericórdia. Significa também abandonar o caminho da agressão, para nos
colocarmos ao serviço do projecto de construção constante da paz. Seguir Jesus
significa também abandonar a mesa de quem procura a felicidade na riqueza a
qualquer preço, e decide colocar-se ao serviço dos pobres, dos excluídos,
daqueles que não têm importância para a sociedade. Este caminho tem
consequências muito duras, nomeadamente sofrimento, rejeição e morte. No
futuro, a ressurreição. Compreendemos, então, como funciona o instinto de
sobrevivência que não quer dar ouvidos à novidade presente na história: faz de
tudo para ficar longe dos problemas, daquilo que põe em risco a existência,
buscando constantemente a tranquilidade. Este estilo de vida é a morte da alma,
porque impede a coragem de entrar no caminho do amor que se dá gratuitamente,
da vida que se perde para os outros, da libertação das tradições que sufocam o
presente.
Ele fez esse discurso abertamente. Pedro chamou-o de
lado e começou a repreendê-lo. Mas ele, voltando-se e olhando para os seus
discípulos, repreendeu Pedro e disse: «Para trás de mim, Satanás! Porque você
não pensa segundo Deus, mas segundo os homens"
Satanás é toda aquela
realidade, aquelas situações que atrapalham a Palavra de Jesus, tirando-a do
coração das pessoas. O pensamento de Pedro é sintomático da rejeição do caminho
proposto por Jesus, que exige também a capacidade de rejeitar as consequências.
Quem se deixa levar pelo instinto de sobrevivência e procura o caminho da
tranquilidade e da segurança nunca conseguirá não só compreender a mensagem de
Jesus, mas sobretudo segui-la.
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