(Is 43, 16-21; Sal 126; Fil 3, 8-14; Jo 8, 1-11)
Paolo Cugini
1. Estamos chegando ao fim da caminhada de quaresma e a liturgia nos
oferece a oportunidade de concretizar o sentido daquilo que meditamos ao longo
destas semanas. Como já lembramos nestes domingos, o tempo de quaresma é um
tempo propicio para aprimorarmos a nossa fé e, assim, tomarmos mais consciência
da nossa responsabilidade com o Batismo que recebemos. A final de conta nos
tornamos filhos e filhas de Deus, criaturas novas e, tudo isso, deveria ser bem
evidente e manifesto nos nossos atos cotidianos, nas decisões que tomamos, nos
projetos que queremos realizar. Não é um caso que, na Igreja primitiva, o tempo
de quaresma era utilizado pela preparação final dos catecúmenos, ou seja,
daquelas pessoas que, na noite de Páscoa, iriam receber o sacramento do
Batismo.
Estamos nos aproximando da
grande celebração da Páscoa e a pergunta que deveria nos acompanhar ao longo
desta semana é a seguinte: quer dizer que em Cristo nos tornamos criaturas
novas? Como é que age no mundo uma pessoa que acolhe o Espírito de Jesus?
2. O Evangelho que acabamos de ouvir nos oferece bastante material
para encontrarmos as respostas que procuramos. A cena que ouvimos é uma das
mais emocionantes de todo o Evangelho: Jesus, uma mulher adultera e o povo. De
um lado o povo enfurecido, que quer apedrejar uma mulher surpreendida em
adultério. Do outro lado Jesus que fica em silencio. É sem duvida esta postura
de Jesus que chama atenção. Porque este silencio? Talvez porque, perante a
arrogância do homem, não sobra que o silencio. Jesus nos convida a silenciar os
nossos julgamentos, os nossos pensamentos, as nossas condenações perante um
pecador, uma pecadora, porque ela também é filho e filha de Deus. Silencio
orante, porque perante o pecador não resta para Igreja outra coisa que esta:
rezar.
“Moises na Lei mandou apedrejar tais mulheres”. É triste constatar
como a Palavra de Deus às vezes é puxada para justificar os nossos atos
horríveis, a nossa estupidez. Por isso Jesus cala. O que precisa dizer perante
uma humanidade que não tem nenhuma vergonha de citar a Palavra de Deus pra
cometer um crime? Precisa comentar alguma coisa?
3. “Quem dentre vós não tiver
pecado seja o primeiro a atirar-lhe uma pedra”.
Jesus não veio para julgar e
condenar ninguém. O tempo do julgamento e da condenação será somente no fim dos
tempos (Jo 5, 21ss, Mt 25). Isso quer dizer que, até quando não chegará este
dia, qualquer momento é importante pela nossa converso. Por isso Deus mandou o
seu Filho Jesus no meio de nós, para falar conosco e despertar em nós a imagem
de Deus perdida por causa do pecado. Escutando a Sua Palavra, todos deveriam
sentir o desejo de abandonar os caminhos negativos e procurar a vida verdadeira,
que somente Jesus pode nos oferecer. Para isso acontecer, precisamos entrar em
nós mesmos, tomar consciência da nossa vida, da nossa situação. É isso que
Jesus tenta fazer com aquela pergunta impressionante: “Quem não tiver pecado...”. E quem é que não tem? Quem é aquele
homem e aquela mulher que não tem consciência das próprias faltas? Tudo mundo
tem, só que para isso se tornar evidente, o homem deve ter a possibilidade de
entrar em si mesmo, para se escutar. A pergunta que Jesus coloca, não julga
ninguém, mas oferece a todos a possibilidade de entrar em si mesmo, captar a
própria situação, que é uma situação de pecado, de miséria e, ninguém, nesta
situação, tem o direito de julgar ninguém.
O Evangelho relata que, depois de Jesus ter colocado aquela
pergunta, não ficou ninguém. A pergunta de Jesus surtiu o efeito esperado:
ninguém atirou pedras na mulher. Deveria ser esta a postura da Igreja no mundo.
Não uma Igreja que julga e condena, que atira pedras, mas uma Igreja que
oferece a todos a possibilidades de entrar em si mesmos, para que cada um possa
se encontrar a só com Deus e experimentar a sua grande misericórdia. É, de
fato, no encontro pessoal com Deus, que a humanidade descobre o caminho de
volta para o Pai.
4. “Eu também não te condeno.
Podes ir, de agora em diante não peques mais”.
A mulher pecadora encontrou em Jesus uma possibilidade de vida. De
certa forma, escapando da condenação à morte do povo, voltou a viver,
ressuscitou. Os homens enxergavam na mulher a aparência de pecado e de morte,
Jesus enxergou nela uma possibilidade de vida nova. Por isso Jesus não entrou
em contato com a mulher com uma condenação, mas sim com palavras de misericórdia.
Só a misericórdia permite ás pessoas de abrir o coração, de se disponibilizarem
para caminhar atrás do Senhor. O Espírito Santo que recebemos no batismo,
deveria formar em nós este olhar diferente, que não esbarra nas aparências
superficiais, mas que consegue entrar na profundeza do coração humano, pra
vislumbrar nele uma nova possibilidade de vida. É o pecado que fecha os nossos
olhos. Quando ficamos escandalizados do pecado dos outros, é porque estamos
vendo claramente aquilo que pode produzir o pecado que está em nós. Perante o
pecador, Jesus exige silencio e oração. Silencio pra ficarmos constantemente alertados
sobre o desastre que o nosso pecado pode provocar. Silencio como necessidade de
um continuo estado de conversão. Na perspectiva do Evangelho, o pecado de um
nosso irmão, de uma nossa irmã, deveria ser considerado como uma alerta para a
nossa caminhada de fé. Perante o pecador, a única coisa que podemos fazer é a
oração e oferecer espaços para o pecador se encontrar com Deus.
5. Se quisermos que se forme em nós o mesmo olhar puro de Jesus,
precisamos modificar o nosso relacionamento com o nosso passado, os nossos
sonhos, os nossos projetos. É disso que são Paulo, na segunda leitura de hoje,
nos alerta. “Considero tudo como lixo,
para ganhar Cristo e ser encontrado unido a ele” (Fil 3, 8).
Se o pecado dos outros, sobretudo
das pessoas mais próximas, nos irrita é porque amiúde atrapalha os nossos
projetos. Para termos o olhar puro de Jesus, precisamos ser desprendidos de
tudo, sobretudo de nós mesmos. È fácil ser desprendidos das coisas matérias:
difícil é nos despojarmos do nosso homem velho, do nosso passado, daquilo que
achamos importante na nossa vida. Ser cristão é reconhecer que a única coisa
que vale a pena levar conosco na viagem da vida é Cristo: o resto é lixo!
É algo de novo que Deus que realizar conosco através de seu Filho
Jesus: é isso que devemos enxergar! “Eu
que eu farei coisas novas e que já estão surgindo: acaso não as reconheceis?” (Is
43, 19).
Este tempo de quaresma deveria nos ajudar a chegar á Páscoa com o
coração totalmente desprendido de tudo, pra deixar a luz da ressurreição de
Cristo entrar e nos conduzir aonde Deus quiser.
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