mercoledì 30 luglio 2025

XVIII DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO C

 




Lucas 12,13-21

Paulo Cugini

 

A dimensão espiritual da vida, se não tiver repercussões, impacto na vida material, está destinada a definhar. No ensinamento de Jesus, a conexão entre fé e vida, entre o espiritual e o material, é visível. A relação de amor com o Pai torna-se visível nas relações generosas e altruístas que Jesus estabelece com as pessoas que encontra. A escuta da Palavra, que orienta a vida dos fiéis para serem portadores da imagem divina de Deus, é visível na atenção aos pobres. Por fim, a liturgia celebrada no templo transforma-se em vida fraterna, que nos leva a ver os outros como irmãos e irmãs. No Evangelho de hoje, Jesus mostra-nos as consequências negativas de uma vida espiritual que não tem impacto na vida real e permanece fechada dentro dos muros do sagrado, produzindo o oposto do que busca: morte em vez de vida.

“Tenham cuidado e fiquem alertas contra toda a ganância, pois a vida de um homem não consiste na abundância das coisas que ele possui.”

O valor da vida de uma pessoa não depende do que ela tem, mas do que ela dá. Esta, em suma, é a mensagem resumida do Evangelho de hoje, que é um convite a não se deixar deslumbrar pelas ilusões da riqueza. O que guardamos e acumulamos, de fato, não é algo que possuímos, mas sim algo que nos possui. No Evangelho de hoje, Jesus é abordado sobre o tema da herança. A resposta de Jesus é categórica. A herança é um fruto venenoso, porque quem deixa uma herança significa que acumulou em sua vida, e a acumulação é consequência de uma escolha egoísta. Pensa-se que, ao deixar algo como legado para a posteridade, estamos fazendo o bem, mas, na realidade, estamos deixando algo negativo que cria divisões. A herança é, portanto, o símbolo da ganância, de uma vida centrada em si mesmo, sem a menor preocupação com os outros, especialmente os mais pobres. O que temos deve ser compartilhado. Subjacente ao discurso está a ideia de que a acumulação, fruto da ganância, é uma forma de idolatria, um substituto de Deus.

Então ele lhes contou uma parábola: “A terra de um homem rico produziu com abundância… E ele pensou consigo mesmo: ‘O que farei? Não tenho onde armazenar minha colheita.

O homem rico está terminalmente doente de egoísmo, e não há salvação para ele. Esta pode parecer uma afirmação dura, mas seu conteúdo encontra eco em outros textos do Evangelho. Por exemplo, a narrativa do encontro de Jesus com o jovem rico. No final desta história, Jesus afirma peremptoriamente que um homem rico dificilmente entrará no reino de Deus. Na parábola de hoje, Jesus procura explicar o processo de pensamento do homem rico, a lógica existencial subjacente à acumulação. Como pensa o rico? Ele pensa exclusivamente em si mesmo e não tem consideração pelos outros, especialmente pelos pobres. Os ricos têm direito a tudo. Jesus descreve a ganância, a avareza. Na mente do rico, em seu raciocínio, se assim se pode chamar, não há o menor indício de solidariedade, porque o rico pensa apenas em si mesmo: ele é o protótipo do egoísmo. O personagem da parábola já é rico e, tendo uma colheita abundante, não pensa em compartilhar com os pobres, pois ele próprio não precisaria. Em vez disso, tomado pelo seu egoísmo, ele pensa em como aumentar seus depósitos. É importante notar que, na época de Jesus, os ricos eram considerados abençoados por Deus, enquanto os pobres eram punidos. Jesus expõe esse pensamento hipócrita, típico da religião formal, que separa a fé da vida, o templo da praça pública, o sagrado do profano. Essa separação só pode levar a uma existência esquizofrênica, onde no templo você adora o Deus que criou a vida e, então, em sua vida cotidiana, o rico priva os pobres de suas chances de vida, acumulando bens para si mesmo.

Mas Deus lhe disse: "Homem insensato! Esta mesma noite te pedirão a vida. Então, para quem serão as coisas que preparaste?"

O que Jesus pensa dos ouriços, que passam a vida inteira acumulando bens e dinheiro? Que são tolos. A expressão usada por Jesus é um tanto atenuada pela tradução, que seria: tolo! Quem acumula pensando apenas em si mesmo é um tolo, porque é incapaz de pensar e apreender a própria vida dentro de um horizonte que vai além do seu próprio umbigo, da sua própria história temporal. O rico, na perspectiva do Evangelho, é uma pessoa que não consegue raciocinar, é incapaz de pensar: é um tolo, um tolo. Na parábola contada por Jesus, o rico é um tolo porque não consegue desfrutar o que acumulou, porque a riqueza obscureceu a sua mente.

Assim é aquele que acumula tesouros para si mesmo e não é rico para com Deus."

A questão subjacente a esta declaração peremptória e significativa de Jesus é esta: como nos tornamos ricos aos olhos de Deus? Doando aos outros. Nos Atos dos Apóstolos, também escritos por Lucas, afirma-se que há mais alegria em dar do que em receber. O segredo evangélico da felicidade é que ela não se mede pelo que temos e acumulamos, mas pelo que damos e partilhamos generosamente com os necessitados. Este é o Evangelho! É esta mensagem que devemos proclamar ao mundo não apenas com palavras, mas através de escolhas concretas de partilha e solidariedade com os mais pobres.

 

sabato 19 luglio 2025

16º DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO C

 




Lucas 10,38-42

 

 

Paolo Cugini

Continuando a viagem, Jesus entrou numa aldeia onde uma mulher chamada Marta o recebeu. Ela tinha uma irmã chamada Maria, que estava sentada aos pés do Senhor, ouvindo a sua pregação. Marta, porém, estava distraída com muitos serviços. Então, aproximou-se e disse: "Senhor, não te importas que minha irmã me tenha deixado sozinha a servir? Dize-lhe, pois, que me ajude." Mas o Senhor lhe respondeu: "Marta, Marta, estás ansiosa e afadigada com muitas coisas, mas uma só é necessária. Maria escolheu a boa parte, que não lhe será tirada."

 

Há passagens no Evangelho que são como ícones, cujo poder comunicativo permanece imediatamente impresso na alma. Uma dessas passagens é, sem dúvida, o texto de hoje, que conta a história das irmãs Marta e Maria, como um díptico que imediatamente provoca reflexão em quem o ouve. De um lado, está Marta, ocupada, distraída com seus muitos afazeres.  Do outro, está sua irmã Maria, cuja atitude é oposta à de Marta. Maria, de fato, sentada aos pés do Senhor, ouvia sua palavra. O que Jesus queria comunicar com a diferença entre essas irmãs? O que ele queria expressar com aquela afirmação categórica no versículo final que diz: "Mas uma coisa é necessária: Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada". Sendo uma passagem famosa, houve muitas interpretações. Aqui, quero destacar apenas duas.

A primeira, e mais imediata, vê Maria como o símbolo da vida contemplativa, inteiramente dedicada à oração, enquanto Marta é o símbolo da vida ativa, daqueles que se entregam à ação, alheios a qualquer reflexão. De fato, ouvindo atentamente o texto, percebe-se que não se trata de uma oposição clara, de uma exclusão da vida ativa em favor da contemplativa. Estamos, de fato, dentro da cultura semítica, e sempre que se afirma uma oposição exclusiva, está-se, na verdade, sublinhando uma prioridade. A afirmação: " Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada", não significa excluir o estilo de vida ativo de Marta, mas indica uma prioridade, uma ordem a ser estabelecida na vida. A ação que é fruto de um momento prévio de reflexão tem sentido e importância. O risco, de fato, na vida consiste em deixar-se sobrecarregar por atividades, por tantas coisas para fazer, que comprometem seriamente a vida de fé. Quando nos deixamos envolver pelos problemas e reagimos imediatamente, querendo resolver tudo de imediato, corremos o risco de perder de vista o que é essencial e não pode ser deixado de lado. Se parafrasearmos o conselho de Jesus, poderíamos dizer que não podemos nos dar ao luxo de começar o dia mergulhando imediatamente nas coisas que precisam ser feitas. Tudo deve ser antecipado com a escuta atenta da Palavra, uma escuta que deve então ser traduzida nos pensamentos de Jesus, que nos ajuda a discernir os problemas que enfrentamos ao longo do dia, a partir do que ouvimos pela manhã. Dessa forma, as ações e atividades que realizamos durante o dia encontram uma conexão, um fio condutor, porque são impulsionadas por uma única inspiração. Quando a ação se baseia na escuta atenta da Palavra, ela se torna material para reflexão posterior. A melhor parte escolhida por Maria é o mundo com o qual começar o dia, para que tudo adquira o sabor da escuta da Palavra do Senhor.

A segunda interpretação é menos imediata e mais refinada, em certo sentido, mais sofisticada, levando em conta a cultura semítica em que a cena se passa e também o contexto literário proposto pelo evangelista Lucas. Há alguns detalhes iniciais que são importantes de sublinhar para melhor compreender a mensagem de Jesus. Enquanto eles estavam a caminho, Jesus entrou; eles estavam a caminho, mas somente Jesus entrou, porque os discípulos ainda não pareciam capazes de compreender a lição que Jesus estava prestes a ensinar. O texto prossegue afirmando que Jesus entrou em uma aldeia. Sempre que encontramos a indicação geográfica de uma aldeia nos Evangelhos, é um aviso de que Jesus encontrará resistência, incompreensão e hostilidade em relação à novidade que Ele propõe. A aldeia é um lugar apegado à tradição, que prospera com o que aconteceu no passado e que afirma: por que mudar se sempre foi assim ? Maria se coloca na posição de discípula em relação ao Mestre. Sentar-se aos pés de alguém significa reconhecê-lo como mestre. A atitude de Maria não é de adoração, mas de discípula. Maria é uma mulher e, segundo a tradição dos Padres, ela deve permanecer na cozinha; ela deve permanecer invisível e não se expor. As palavras da Lei não podem ser ensinadas a uma mulher, como diz o Talmude. Marta representa a tradição e é inteiramente egocêntrica : minha irmã... me ajude . Marta não suporta que sua irmã tenha transgredido a tradição e pede a Jesus que a empurre de volta para o lugar onde a tradição sempre colocou as mulheres. Jesus, no entanto, aprova a escolha de Maria. " Maria escolheu a melhor parte, que não lhe será tirada." O que é que não pode ser tirado de Maria ? Ela escolheu a liberdade através da transgressão das regras da tradição e é, portanto, fruto de uma escolha pessoal. Essa conquista pessoal não pode ser tirada. Jesus, portanto, nos convida a seguir o exemplo de Maria e escolher o caminho da liberdade, rompendo com a tradição patriarcal e misógina dos Padres

venerdì 18 luglio 2025

XVII DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO C

 




Lucas 11,1-13

 

Paulo Cugini

 

Ensinar a orar é um dos pilares da jornada espiritual, da relação entre Mestre e discípulo. Além disso, o pedido de um dos discípulos deriva diretamente da experiência dos discípulos de João Batista. Portanto, no contexto do discipulado, estamos entre aqueles que buscam sentido na vida e já fizeram escolhas concretas, já posicionando suas vidas em direção à busca de um caminho espiritual. Outro ponto importante, novamente como introdução ao tema, é que, com a oração, entramos no âmbito de um pedido que fala de uma necessidade espiritual, que, portanto, não satisfaz exigências materiais. Essas são ênfases que orientam a leitura e a interpretação do texto em nosso contexto cultural, que luta não apenas para considerar a dimensão espiritual importante, mas também para se considerar necessitado de algo ou alguém.

Jesus estava em algum lugar orando. Jesus orava, e no Evangelho de Lucas frequentemente encontramos essa atitude em Jesus. Quando Jesus ora, nunca está no templo ou na sinagoga, onde vai ensinar, mas em espaços isolados, ao ar livre, em contato com a natureza. Além disso, ele nos dirá no Evangelho de João que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em Espírito e verdade, que não há necessidade de um lugar específico. Recuperar essa dimensão pessoal e espiritual da oração é importante, porque nos ajuda a ir além da lógica das fórmulas e a entrar na lógica dos relacionamentos.

Ao orar, diga: "Pai". Jesus não quer bajuladores e, portanto, não quer que nos dirijamos a Ele com títulos altivos como: altíssimo, sublime, onipotente, onisciente, porque esses títulos não revelam Sua verdadeira face e são fruto de pesquisa filosófica e sapiencial, não de um dom recebido dEle. Chamar Deus pelo título de Pai significa que a relação que Deus deseja estabelecer conosco é de paternidade e, portanto, filial. Deus não quer devotos, mas filhos. Na cultura da época, pai é alguém que transmite toda a sua vida ao filho e, portanto, reconhece Deus Pai como a fonte da vida.

Santificado seja o teu nome. Como o texto sugere, mais do que uma fórmula, a oração que Jesus ensinou aos seus discípulos indica um caminho, um estilo de vida. Pai, santificado seja o teu nome. O verbo está na voz passiva aoristo, significando que o Pai é santificado pelo estilo de vida daqueles que o invocam. Há um modo de vida que santifica o nome do Pai, que é santificado, reconhecido como tal, quando o discípulo vive o que ouve. O início da oração que Jesus ensina é um pedido de ajuda ao discípulo na jornada que embarcou.

Venha o teu reino. Este não é um espaço político, uma exigência conforme à lógica do mundo. O Reino do Pai tornou-se visível pela ação do Filho que, como diz o salmo, abriu os céus e desceu. Jesus trouxe o céu à terra. O que é, então? Como o Reino de Deus se manifestou em Jesus Cristo? Através de uma vida de amor altruísta e gratuito, visível nas relações de confiança que ele soube estabelecer. As qualidades do Reino de Deus são, entre outras, a justiça, a paz e a igualdade. Pedir em oração a vinda do Reino de Deus não é uma projeção após a morte, mas o desejo de nos tornarmos protagonistas deste Reino, colaborando a cada momento para a sua realização.

O pão nosso de cada dia nos dai a cada dia. Por isso, para continuar a obra iniciada por Jesus em nossa vida cotidiana, precisamos de alimento que nos sustente. Este pão que nos sustenta em nossa vida cotidiana é o próprio Jesus, sua Palavra de vida que nos nutre e que assimilamos para chegar a pensar e discernir da mesma forma que Jesus. O pão de cada dia que nos ajuda a escapar da lógica do mundo é a nossa relação com os pobres, porque neles vemos Jesus e com eles e por eles partilhamos os nossos bens. Por fim, a Eucaristia é o nosso alimento, porque é precisamente no contexto eucarístico que Jesus se dá como alimento para transformar toda a nossa vida na sua.

E perdoai-nos os nossos pecados, pois também nós perdoamos a todos os nossos devedores. Isto diz respeito às dívidas materiais. A comunidade de Cristo é uma comunidade de irmãos e irmãs que partilham o que têm. Jesus liga o pedido de perdão dos pecados não a um ato de adoração, mas ao estilo de vida da comunidade cristã que, em nome do amor recebido e do exemplo de Jesus, aprendeu a partilhar e a perdoar — a tolerar — as dívidas materiais dos irmãos e irmãs. Isto significa que o pedido de perdão dos pecados implica um estilo de vida em comunidade onde partilhamos os nossos bens materiais, a ponto de perdoar as dívidas que alguém nos deve.

Não nos abandoneis em tentação. A que Jesus se refere quando diz estas palavras? Como a comunidade entende esta instrução? Que tipo de provação é esta? A referência histórica é provavelmente a provação da perseguição, que foi muito severa contra os cristãos nas primeiras décadas após a morte e ressurreição de Cristo. Esta tentação teve como primeiras vítimas os discípulos, e entre eles, o líder, ou seja, Pedro. É a tentação de abandonar o campo quando nos sentimos sozinhos no nosso testemunho e ficamos confusos, porque nos sentimos em menor número, abandonados. A oração pede-nos que continuemos a sentir a presença do Senhor mesmo nestes momentos de solidão, para vencer a tentação de desistir de tudo, de deixar a comunidade.

 

sabato 5 luglio 2025

XIV DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO C






Paolo Cugini

 

Quem na Igreja tem a tarefa de evangelizar? Qual caminho de formação é necessário para ser capaz de tanto? Estas são algumas das questões que subjazem ao texto de hoje. O anúncio do Reino de Deus, que Jesus inaugura, é confiado aos discípulos, homens e mulheres, isto é, àqueles que escolheram estar com Jesus, acompanhá-lo em sua missão, conhecê-lo, ouvi-lo. Aquele ou aquela que se sentiu envolvido por seu amor a ponto de decidir segui-lo, renunciando ao resto, pode falar de Jesus ao mundo. Este é o primeiro aspecto fundamental do discurso missionário. Torna-se colaborador do Reino quem entrou em um caminho de discipulado. Isso significa que, antes de tudo, os missionários são discípulos.

Ides.

A confiança que Jesus dá aos seus discípulos é impressionante. Eles estão a meio caminho de uma jornada que hoje chamaríamos de formativa e Jesus não tem escrúpulos em enviá-los dois a dois para a batalha. Ele não tem medo de queimá-los, mas confia neles. É o dom da ausência que permite aos discípulos se tornarem mestres. É na ausência do pai e da mãe que o filho pode experimentar a si mesmo, tem a oportunidade de colocar sua criatividade em ação. O dom da ausência, de fato, estimula o sujeito, que não pode mais contar com a figura de referência, mas que é obrigado a processar pessoalmente o material aprendido. Torna-se mestre quando se tem um pai e uma mãe que dão o dom da ausência aos seus filhos, quando depositam sua confiança nele, permitindo-lhe, em certo ponto da jornada, aprender a caminhar com seus próprios pés.

 ele os enviou dois a dois à sua frente.

O primeiro efeito do discipulado segundo o Senhor é que ele nos afasta da solidão, da condenação de caminhar sozinhos pelos caminhos da vida. É por isso que, também a missão, não é uma escolha privada de algum aventureiro, mas um mandato comunitário. O Evangelho nasce de uma experiência comunitária e é como comunidade que o Evangelho é anunciado. Caminhamos juntos com alguém, alguns, porque cada pessoa é criada por Deus não para viver sozinha, mas com alguém: Não é bom que o homem esteja só. É na comparação com o outro que aprendemos a nos conhecer, a nos reconhecer. Na missão, não trazemos simplesmente palavras, mas um modo de viver, um estilo de vida. 

Eis que eu vos envio como cordeiros ao meio de lobos; não leveis bolsa, nem sacola, nem sandálias; e a ninguém saudeis pelo caminho.

A missão exige total confiança no Senhor, manifestada pelo desapego das coisas materiais, ou seja, a missão não depende dos bens que se possui, mas do amor a Deus assimilado ao longo do caminho. Esse despojamento também é necessário porque o missionário é chamado a levar uma mensagem de paz com métodos não violentos em um mundo violento e agressivo. “Eu vos envio como cordeiros ao meio de lobos ” significa que o conteúdo da mensagem de amor do Senhor deve ser mediado pelo estilo não violento dos discípulos-missionários. Aprender a não responder agressivamente às provocações violentas do mundo é, antes de tudo, um dom do Espírito Santo, cultivado e implementado nas relações cotidianas na comunidade cristã e na família.

Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: ‘Paz seja com esta casa!’ E se ali houver um filho da paz, a vossa paz repousará sobre ele; mas, se não, voltará para vós… Mas, quando entrardes numa cidade e não vos receberem, saí pelas ruas e dizei: ‘Até o pó da vossa cidade, que se nos agarrou aos pés, sacudimos contra vós. Contudo, sabei isto: o Reino de Deus está próximo.’”

O discípulo missionário não anuncia o Reino de Deus com técnicas de persuasão. A entrada no Reino dos Céus não é uma questão de números e, por isso, não é uma mensagem coercitiva. É uma proposta feita em liberdade que exige liberdade. É uma mensagem que deve estimular o desejo de vida verdadeira naqueles que a buscam; um desejo de sentido de vida e autenticidade naqueles que estão insatisfeitos com o que vivem. Por fim, o anúncio do Reino de Deus deve estimular o desejo de justiça e paz em todos aqueles que têm fome e sede de Justiça, que permanecem perplexos com tanta corrupção e injustiça no mundo. Por isso, o discípulo missionário, quando se depara com uma recusa, não insiste em convencê-lo, mas continua seu caminho, porque sabe que a entrada no Reino dos Céus não depende de jogos de palavras, mas de escolhas de vida.

 Mas não vos alegreis porque os demônios vos obedecem, mas alegrai-vos porque os vossos nomes estão escritos nos céus.

O discípulo-missionário aprendeu a basear seu bem-estar espiritual na relação de amor com o Senhor e não no sucesso de sua ação evangelizadora. Este também é um ponto crucial no caminho do discipulado, que consiste em aprender a encontrar o ponto onde confiar suas motivações, para continuar a jornada sem perturbações. A missão que o Senhor nos confia é cheia de momentos belos, mas também de situações negativas, que causam profundas frustrações. Aprender a centrar suas motivações em uma dimensão espiritual, na relação filial e amorosa com o Senhor, significa proteger-se da tentação de desistir diante de tantos fracassos e tantas frustrações. Somente o Senhor é a nossa força e o sentido da nossa jornada.

venerdì 13 giugno 2025

SOLENIDADE DA SANTÍSSIMA TRINDADE

 



 

Pv 8, 22-31; Sl 8; Rm 5, 1-5; Jo 16, 12-15

 

Paulo Cugini

 

A solenidade da Santíssima Trindade nos conduz ao Mistério de Deus. Um grande Mistério que, desde os primeiros séculos, a Igreja tem procurado explicar, compreender, também com a ajuda da cultura da época, a filosofia grega. O que daí resultou foi um conjunto de definições nem sempre fáceis de compreender e, sem dúvida, a homilia não é o lugar para nos aprofundarmos nesse labirinto de redes conceituais. Portanto, confiamos na Palavra do dia.

Quando ele lançou os fundamentos da terra,
eu estava ao seu lado como um artesão
; eu era diariamente o seu deleite;
eu brincava diante dele em todo o tempo;
eu brincava na esfera da terra
 (Provérbios 8:30).

Confiar na Palavra significa crer que, dentro de discursos que também provêm da cultura de um povo e de uma época, há também um sopro misterioso, divino, um conteúdo que remete a algo mais, que não pode ser encerrado nos simples dados humanos. Há algo mais que, se escutado, revela conteúdos que desmantelam nossas construções conceituais ou devocionais sobre Deus que, com o tempo, formam preconceitos, conceitos indestrutíveis. O que a Palavra nos diz, então, sobre o mistério de Deus? A página do livro de Provérbios que escutamos nos revela que no início de tudo não há um pecado, um erro, como afirmava Agostinho quando falava do pecado original, mas um jogo. " Eu brincava diante dele a todo momento, eu brincava no globo". No início de tudo, há o olhar sorridente de Deus Pai e Mãe para sua filha, uma criança (a sabedoria é feminina), que brinca. Na origem de tudo há um jogo, um sorriso de alegria, que brota da relação alegre do Pai-Mãe com a filha, cujo nome é Sabedoria, que, como nos lembra o versículo inicial do capítulo 8 do livro dos Provérbios, foi criada pelo Senhor como o início de sua atividade. No caminho da fé, o Mistério se revela no jogo: ele gosta de nos observar enquanto jogamos. É no jogo que a Sabedoria que provém do Mistério se liberta.

A Sabedoria que provém do Mistério brinca diante dele: o que significa esse brincar? Não é por acaso que, no Evangelho de João, a vida pública de Jesus se abre com uma festa de casamento, cumprindo assim a profecia de Isaías 24-27. O Evangelho é alegria, é festa. A ideia de brincar, de fato, expressa pela bela passagem do capítulo 8 do livro de Provérbios, abre caminho para uma série de significados que costumam ser deixados de fora dos discursos religiosos. Brincar significa felicidade, alegria, criatividade, paixão, prazer, liberdade, amizade. Situações existenciais que marcam profundamente o cotidiano das pessoas, mas que a religião não considera como tal, porque está muito acostumada a se fechar em si mesma e a se identificar com uma aparência de seriedade falsa e hipócrita. O teólogo protestante Bonhoeffer disse em seu belo livro Resistência e Rendição que devemos aprender a reconhecer Deus não apenas em situações de sofrimento, dor, doença, como estamos acostumados a fazer, mas também e sobretudo, em situações em que a vida se manifesta como alegria, na arte, por exemplo, em uma bela música ou, por que não, em uma festa com amigos.

Vêm à mente as cenas do Evangelho em que há crianças brincando diante de Jesus e os discípulos, irritados, querem afastá-las. Não só isso. Jesus brinca com nossas doutrinas. Ele abraça os leprosos, mesmo sabendo da lei da impureza, que não permitia que os impuros, como os leprosos, se aproximassem do templo, o que, de um ponto de vista simplesmente lógico, é absurdo. O mesmo pode ser dito no caso em que Jesus toca a mulher que sangrava há 14 anos. Também neste caso, quem toca uma mulher que está perdendo sangue e que, por isso, se torna impura, é ele próprio impuro. Jesus brinca com nossas doutrinas rígidas, que nos tornam pessoas rígidas e, muitas vezes, desumanas. Novamente. Jesus frequentemente e de bom grado brinca com o eixo das leis da Torá, a lei por excelência, que sustenta todas as outras: o sábado. Parece ser feito de propósito, mas Jesus, com frequência e de bom grado, realiza milagres no dia em que é proibido fazer qualquer coisa, a ponto de um líder fariseu lhe perguntar se ele não poderia realizar aquele milagre em outro dia. Jesus, em vez disso, realiza milagres justamente no sábado para brincar com a nossa rigidez, com as nossas tradições humanas, que tivemos a ousadia de trocar, para colocar no lugar da Palavra de Deus (Mc 7,2s).

A Santíssima Trindade nos toma pela mão hoje para nos fazer brincar, para fazer um círculo, para nos livrarmos da aparente seriedade doutrinária, que nos torna pessoas obscuras e rígidas, para entrarmos no caminho da humanização, que não é feito apenas de razão, mas também de paixão e sentimentos. Entrando neste jogo em que o Mistério da Trindade nos convida a entrar, será mais fácil captar os sinais da Sua presença e, assim, abandonar as fantasias religiosas para nos deixarmos abraçar pela realidade da vida que Ele nos dá.

 

sabato 31 maggio 2025

ASCENSÃO DO SENHOR/C – SOLENIDADE

 




 

Atos 1,1-11; Sl 47; Ef 1,17-23; Lc 24,46-53

 

Paolo Cugini

 

A solenidade da Ascensão do Senhor, que celebramos hoje, deve ajudar-nos a compreender o significado da missão da Igreja no mundo e também do nosso batismo, pois é neste sacramento que recebemos o Espírito Santo. De fato, é na Ascensão do Senhor que os discípulos recebem o mandato de anunciar o Evangelho a todos os homens. A tarefa da Igreja, portanto, é ser testemunha de Cristo. Além disso, a Ascensão do Senhor ensina-nos que o Evangelho não é apenas um anúncio terreno, que se encerra na terra. O Evangelho não é um código de conduta moral, mas a indicação de um caminho que tem como meta o encontro com o Pai. Assim como Jesus passou, através da sua paixão e morte, deste mundo para o Pai (Jo 13), este é o significado da sua Páscoa: nós também devemos ouvi-lo para passar com Ele deste mundo para o Pai. Por isso, somos convidados a anunciar o seu Evangelho ao mundo, o seu único caminho de salvação. E aqui surge o problema: como é possível anunciar este caminho de salvação?

 

Foi a eles que Jesus se mostrou vivo depois da sua paixão (At 1,3).

O primeiro critério para dar testemunho de Jesus no mundo é conhecê-lo, conhecê-lo. Jesus não é uma ideia abstrata, mas uma pessoa concreta; Jesus não é uma criação literária, não é fruto da imaginação humana. Jesus é Deus que se fez homem e veio habitar entre nós: é Deus que se aproximou de nós. É por isso que é impossível conhecer Jesus a não ser através de uma experiência viva, autêntica e profunda. Jesus não envia os seus discípulos para anunciar uma ideia, ou algo do género, mas aquela experiência específica que tiveram com o Senhor. Não é por acaso que Jesus, após sua morte e ressurreição, apareceu apenas aos seus discípulos, isto é, àqueles que foram capazes de reconhecê-lo. Portanto, na raiz do nosso testemunho – porque este é o significado do nosso batismo! – deve estar a nossa experiência com o Senhor Jesus. Não podemos anunciar Cristo se não o conhecemos. Em sua primeira carta, João relata esta mesma reflexão: o que ouvimos, o que as nossas mãos tocaram, isso vos anunciamos (cf. 1 João 1:1-4). A vida cristã não se faz apenas de palavras, mas de experiência autêntica com Cristo. É o conhecimento dEle que nos permite conhecê-lo e, portanto, comunicá-lo ao mundo.

 

Vocês receberão poder ao descer sobre vocês o Espírito Santo (Atos 1:8).

O conhecimento experiencial e pessoal do Senhor, porém, não é suficiente: é necessário o Espírito Santo. Somente o Espírito de Deus pode dar aos discípulos a coragem de proclamar, de testemunhar o Senhor ressuscitado em um mundo que o odeia, que o massacra, que odeia a Deus e, consequentemente, odeia todos aqueles que falam do Filho. Essa coragem não é uma força psicológica, de origem humana, mas algo que vem de Deus, do seu Espírito.

 

Há algo mais. Para ser testemunha, precisamos da força que vem de sermos credíveis. Isso significa que, se queremos ser testemunhas do Senhor, nosso encontro com Ele deve ter mudado significativamente nossas vidas. Como podemos, de fato, proclamar o amor de Cristo aos nossos inimigos se odiamos alguém? Como podemos ser testemunhas da comunhão de Cristo se somos instrumentos de luta e dificuldade? Como podemos ser testemunhas da morte de Cristo que perdoou nossos pecados, se não somos capazes de perdoar? Como podemos proclamar o amor de Cristo aos pobres se gastamos nosso tempo acumulando riquezas, tornando-nos instrumentos de injustiça? Testemunhar significa contar o que Jesus fez não apenas com palavras, mas também e, sobretudo, com a nossa própria vida. A verdade do que anunciamos deve ser claramente visível na nossa carne, na nossa história. Testemunhar não significa dizer o que Jesus fez, mas o que Jesus fez por mim, a salvação que Ele trouxe para a minha vida. Se somos chamados a anunciar a Salvação que Cristo realizou na história através da sua paixão, morte e ressurreição, então tudo isso deve estar escrito na nossa vida, deve ser claramente visível na nossa carne, no nosso modo de ser, de viver, de pensar. Isso só se torna possível se o encontro com o Senhor tiver verdadeiramente trazido a salvação para a nossa existência. Só então as palavras se tornam credíveis, alcançando um peso e uma força impressionantes, que penetram o coração do mundo, perturbando-o, preocupando-o, levando-o a sério. Por isso, São Lucas, pouco depois, nos Atos dos Apóstolos, no quarto capítulo, narra como se estruturou a comunidade dos primeiros cristãos, seguindo a pregação dos discípulos.

 

A multidão dos que tinham chegado à fé era um só coração e uma só alma. Ninguém dizia que suas propriedades eram o que possuía, mas entre eles tudo era comum (Atos 4.32).

É por isso que a pregação dos discípulos atraía multidões: não se tratava de discursos e habilidades retóricas, mas de testemunho. O que os discípulos anunciavam, isto é, a salvação pelo Evangelho de Jesus (cf. 1 Cor 15,1-3), era claramente visível em suas comunidades, compostas por pessoas que viviam o nome de Jesus de uma maneira totalmente nova, não mais animadas pelo egoísmo humano que só causa divisões e rivalidades, mas pelo amor de Jesus que inspira caridade e partilha entre si.

Quais são os sinais que o Espírito Santo produz em nossa humanidade que tornam nosso anúncio crível?

Em primeiro lugar, a humildade. De fato, somente Deus deve ser glorificado por meio de nossa ação. Somente o Espírito pode produzir em nós esse sentimento fundamental da vida cristã, tão presente na vida de Cristo.

Em segundo lugar, a alegria. Os cristãos são alegres não por causa de sua conta bancária ou outros bens materiais, mas porque vivem com Jesus. É isso que Santa Teresa de Jesus queria dizer quando escreveu: “Quem tem a Deus, nada lhe falta. Só Deus basta.”

Peçamos a Deus que, nesta Eucaristia que celebramos, o Espírito Santo produza em nossas vidas aquela humildade e alegria tão necessárias para o testemunho autêntico do seu Evangelho.

sabato 24 maggio 2025

VI Domingo da Páscoa/C

 



 

Paolo Cugini

No tempo da Páscoa, a liturgia nos oferece uma reflexão sobre o significado da presença do Ressuscitado na vida da comunidade cristã, na vida daqueles que o encontraram. De fato, este deveria ser o sentido da Igreja, isto é, do grupo de pessoas que fizeram a experiência do encontro com o Ressuscitado e que o testemunham com um novo estilo de vida, que apresenta características específicas. Na narrativa dos Atos dos Apóstolos, cada vez que Paulo é chamado a se defender diante das autoridades romanas das acusações dos judeus (Atos 22 e 26), ele o faz narrando a mudança operada por seu encontro com o Ressuscitado. Esta é então a pergunta que busca abrir o sentido das leituras propostas pela liturgia de hoje: o que deve acontecer com as pessoas que encontraram o Ressuscitado?

As duas primeiras leituras nos oferecem material semelhante para a nossa resposta, que poderíamos formular assim: o encontro com o Ressuscitado nos liberta da religião falsa, aquela feita de normas e prescrições, que escravizam os homens em vez de libertá-los. Esta foi a experiência de Paulo que ele procura compartilhar em suas viagens missionárias, afirmando que o Evangelho de Jesus libertou a humanidade de todas aquelas prescrições que, em vez de aproximar a humanidade do Pai, a afastam. É justamente neste ponto que Paulo e Barnabé encontrarão forte resistência dos judeus convertidos ao cristianismo, que queriam impor as leis mosaicas também aos pagãos convertidos. 

Naqueles dias, alguns homens desceram da Judeia e ensinaram aos irmãos: “Se não vos circuncidardes, conforme o costume de Moisés, não podeis ser salvos” (Atos 15:1). O Concílio de Jerusalém, do qual se relata um trecho do documento final na primeira leitura, discutirá justamente este ponto e serão fundamentais os testemunhos de Pedro e Paulo sobre a descida do Espírito Santo também sobre os pagãos. Em sintonia com este caminho, estão as palavras do Apocalipse relatadas na segunda leitura, que afirma que, na nova Jerusalém, segundo a visão de João, não haverá templo, porque: “o Senhor Deus Todo-Poderoso e o Cordeiro são o seu templo”. (Ap 21, 22). O templo de Jerusalém, especialmente o segundo templo, aquele reconstruído após o retorno do exílio na Babilônia, havia se tornado o símbolo de uma religião composta de tantos preceitos e regras que um relacionamento pacífico com Deus era impossível. Por isso, no diálogo com a samaritana, Jesus dirá que, para um diálogo autêntico com o Pai, não haverá mais necessidade de templos porque: «os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade» (Jo 4, 23).

A comunidade daqueles que encontraram o Ressuscitado, além de se libertar da falsa religião dos preceitos, torna-se uma presença de paz no mundo. Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou. Não vo-lo dou como o mundo o dá (Jo 14,25-26). A Sagrada Escritura considera a paz não apenas como a ausência de guerra, mas sobretudo como um dom de Deus e a plenitude de todas as suas bênçãos. Esta é a mensagem central da esperança messiânica anunciada pelos profetas, que a veem realizada na harmonia das origens entre o homem e a criação: "O lobo habitará com o cordeiro..." (Is 11,6-9; cf. Is 65,25) e na convivência pacífica e fraterna: "Forjarão das suas espadas relhas de arado, e das suas lanças, foices... e não aprenderão mais a guerra" (Is 2,4). É essa paz que Jesus trouxe entre nós, como rejeição a toda forma de violência. Jesus, de fato, como nos diz São Paulo, reconciliou os povos em conflito atraindo o ódio deles para a sua própria carne (cf. Ef 2,14ss). A vida do Ressuscitado é visível, então, no esforço que fazemos todos os dias para construir a paz, para reconciliar as pessoas, para fazer com que os opostos possam coexistir.

domenica 18 maggio 2025

DOMINGO V DE PÁSCOA TEMPO/C

  



 

Paulo Cugini

O que o tempo da Páscoa significa para a comunidade cristã? O que a ressurreição de Cristo deve trazer para seus discípulos, tanto homens quanto mulheres? Parece-me que esta é a pergunta que pode abrir a compreensão das leituras que ouvimos.

Então eles constituíram anciãos para eles em cada igreja  (Atos 14:21). A primeira resposta encontra-se nos Atos dos Apóstolos. Na passagem de hoje, Lucas nos fala sobre o primeiro esboço da estrutura da comunidade. Paulo e Barnabé não apenas proclamam o Evangelho e exortam seus ouvintes, mas também estão preocupados com o futuro das comunidades que criaram. A luz do Ressuscitado se manifesta na inteligência de quem a acolhe, o que se materializa na reflexão sobre como dar continuidade à mensagem do Evangelho após a ausência dos missionários. Há um desígnio que, antes de ser sinal de eficiência exasperada, se torna manifestação visível de amor às pessoas encontradas no caminho da evangelização.

Eu, João, vi um novo céu e uma nova terra; o primeiro céu e a primeira terra passaram, e o mar já não existe (Ap 21:1). A segunda ideia significativa que emerge das leituras de hoje sobre a novidade produzida pela luz do Ressuscitado nas pessoas que a acolhem é a capacidade de ver a novidade. Assim como os profetas eram visionários, pessoas capazes de ver vida onde se pensava apenas na morte, assim também a comunidade cristã que encontrou o Senhor da vida é caracterizada por essa atitude, que se manifesta no dom de ver paz onde a humanidade vê guerra, de ver amor onde só se pode discernir dinâmicas de ódio. Querendo atualizar a mensagem, nesta situação aparentemente desesperadora da guerra na Ucrânia, enquanto os governos propõem medidas de rearmamento como forma de alcançar a paz, a única voz que se destaca parece ser a do Papa Francisco, que insiste em afirmar que a paz se faz através do diálogo, da diplomacia e que as armas só produzem morte e guerra. Por isso renovo o meu apelo: chega, paremos, silenciemos as armas, negociemos seriamente pela paz (Papa Francisco, Angelus, Domingo 27.3.2022).

Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns aos outros (Jo 13,34). O terceiro indício significativo que as leituras nos comunicam sobre os sinais da presença do Ressuscitado na comunidade é o processo de essencialização que ele produz. Qual é, de fato, o mandamento do amor que Jesus indica aos seus discípulos pouco antes de sua morte na cruz, senão o sentido mais profundo da vida? Pode parecer trivial e infantil, mas é a única coisa que realmente dá sabor à existência. Às vezes percebemos isso depois de passarmos por experiências dolorosas de solidão, causadas por nossas escolhas egocêntricas, na ilusão de que podemos fazer tudo sozinhos. Ter amor uns pelos outros é tanto um dom quanto uma tarefa. É o dom que o Senhor nos oferece com o seu Espírito, o seu ensinamento. É também e sobretudo uma tarefa que construímos todos os dias, colocando gestos de generosidade e serviço junto das pessoas que estão ao nosso redor ou mesmo junto daquelas que encontramos no nosso caminho. Pode parecer pouco, e é a sensação que nos vem quando buscamos o julgamento dos outros, no processo de construção da nossa identidade. É um grande presente, ao contrário, e o percebemos quando aprendemos com a vida a saborear a beleza e a riqueza de um sorriso, de um olhar atento dado e recebido. São esses pequenos gestos que, além de falar da verdade e da autenticidade dos nossos relacionamentos, permitem que a luz do Ressuscitado se torne visível, para que o mundo creia.

 

sabato 3 maggio 2025

III DOMINGO DE PÁSCOA / C

 




Paolo Cugini

 

A Páscoa é o tempo do ano em que a Igreja nos convida a refletir, de modo novo e original, sobre o sentido da existência. A Páscoa, de fato, ao apresentar o tema do Ressuscitado, provoca a reflexão sobre o tema da vida, seu sentido e sobre aquilo em que realmente vale a pena gastar as próprias energias. Por fim, o Pai ressuscitou o corpo de seu filho Jesus que, durante sua vida, havia escolhido uma vida pobre, humilde e discreta; isto é, ele não buscava glória mundana, poder ou dinheiro. Este aspecto, na minha opinião, deve nos fazer refletir. A ressurreição de Jesus lança uma nova luz sobre a história da humanidade e expõe a pobreza da proposta, totalmente desequilibrada em relação ao material, deixando muito pouco espaço para a dimensão espiritual. Vejamos, a este respeito, o que nos dizem as leituras de hoje.

Eles mandaram açoitar [os apóstolos] e ordenaram que não falassem em nome de Jesus. Então eles os soltaram. Então eles saíram da presença do Sinédrio, regozijando-se por terem sido considerados dignos de sofrer desonra por causa do nome (Atos 5:40-41).

A situação narrada na primeira leitura é indicativa do que aconteceu com aqueles que conheceram o Senhor e o encontraram ressuscitado. Houve uma clara mudança na perspectiva existencial. De fato, eles passaram de uma atitude de medo e abandono diante do Mestre, a ponto de terem que entregá-lo, negá-lo e abandoná-lo, para uma atitude em que se sentem felizes por terem sido ultrajados em nome de Jesus. É a realidade dessa mudança que deixa admirado e se torna um testemunho que vale a pena ouvir para aprofundar a discussão sobre a ressurreição de Jesus, que tem consequências significativas para as pessoas que o encontram. O que aconteceu para provocar uma mudança tão radical? Como é possível que pessoas tão frágeis e medrosas se tornem corajosas e capazes de argumentar sobre suas ações em tão pouco tempo? Encontrar o Ressuscitado significa, entre outras coisas, precisamente isto: testemunhar uma passagem na própria humanidade que deixa uma marca profunda capaz de mudar o caminho. Mudança que não tem explicação humana, que não pode ser explicada com instrumentos científicos, psicológicos: há mais.

Eu, João, vi e ouvi a voz de muitos anjos ao redor do trono, dos seres viventes e dos anciãos. E o seu número era dez mil vezes dez mil, e milhares de milhares; e disseram em alta voz: Digno é
o Cordeiro, que foi morto,
de receber o poder, e riquezas,
e sabedoria, e força, e
honra, e glória, e ações de graças (Ap 5:1ss).

João vê a vitória de Cristo sobre a morte; ele não vê a cruz, mas um trono, um sinal de vitória, e no trono o próprio Deus com o cordeiro sacrificado ao seu lado. O fato interessante é que esse cordeiro sacrificado, que claramente se refere a Jesus, está de pé, em sinal de vitória: ninguém conseguiu dobrá-lo, quebrá-lo. O ódio do mundo não prevaleceu sobre o amor de Jesus, simbolizado pelo fato de ele ser imaginado como um cordeiro abatido. Os cristãos que seguem o Senhor e se alimentam dEle, nutrem a consciência com Suas palavras, com Sua mensagem, não veem no mundo sinais de morte, mas de vitória. Onde o mundo vê morte, os cristãos veem vida. E já que o cordeiro está de pé e venceu o ódio com amor, ele é digno de ser reverenciado para receber poder de Deus Pai. Ser no mundo sinal da vitória de Cristo sobre o ódio e a dinâmica da morte: esta é a tarefa dos cristãos no mundo.

Disse-lhe pela terceira vez: “Simão, filho de João, tu me amas?” Pedro ficou triste porque lhe perguntou pela terceira vez: “Você me ama?” E ele lhe disse: “Senhor, tu sabes tudo; tu sabes que eu te amo.” Jesus respondeu-lhe: “Apascenta as minhas ovelhas” (Jo 21,17).

Na jornada da fé, não somos testados pelo número de ritos e procissões dos quais participamos, mas exclusivamente pelo amor que damos. É preciso acrescentar que se podemos dar amor é porque o recebemos gratuitamente do Filho, por meio do Espírito Santo que o derramou em nossos corações (cf. Rm 5,5). O bálsamo da misericórdia cura as feridas da alma de Pedro que havia negado o Senhor três vezes. Não há culpa, nem desespero, mas apenas misericórdia que cura as feridas. Os relacionamentos que Jesus cria têm esta marca inconfundível: ele não mexe com os homens e mulheres para fazê-los sentir-se mal, mas para trazer à tona o bem que há em cada pessoa. 

 

sabato 12 aprile 2025

DOMINGO DE RAMOS 2025

 




 Paulo Cugini


Neste domingo que abre o caminho da Semana Santa, gostaria de oferecer algumas chaves de compreensão a partir das leituras que ouvimos.

 

1.      A superficialidade de uma religião que é vivida apenas externamente e não influencia nas escolhas da pessoa. O que chama a atenção é a superficialidade das pessoas que primeiro louvam Jesus quando ele entra em Jerusalém e depois clamam por sua crucificação. O que vale a pena é esse caminho de fé que permite que os conteúdos escutados se fixem no coração, de modo que modifiquem os pensamentos e orientem as escolhas.

 

2.      Princípio educacional. Para nos comunicar o caminho da vida autêntica, Ele se aproximou de nós, se fez um de nós: este é o maior ensinamento educativo. É o que nos explica São Paulo na segunda leitura de hoje: Fl 2,5-11. Jesus não nos ensinou o caminho da salvação e da verdadeira vida do alto de um púlpito, mas das profundezas da vida cotidiana, vindo caminhar entre nós.

 

3.      A solidão do homem, da mulher de Deus; mal-entendido, traição. Somente no julgamento do mundo. A tremenda solidão de Jesus nas últimas horas de sua vida é impressionante. Abandonado por todos, traído, entregue, humilhado, insultado: sozinho diante de tudo e de todos. Mas Jesus permaneceu em seu lugar e não tentou escapar. A autenticidade de um caminho espiritual se verifica nas situações de crise, ou seja, na capacidade de permanecer firme, no seu lugar.

4.      A verdade vem da atenção à realidade. Os Evangelhos não esconderam a dureza e o drama das últimas horas de Jesus: não esconderam a realidade dos acontecimentos. Isso significa que a verdade do Evangelho vem através da aceitação da realidade como ela é, contra todas as formas de negacionismo, que são todas formas patológicas da razão.

 

5.      Um olhar de amor infinito . Pai, perdoa-lhes. Uma humanidade que ama dessa maneira revela algo que vai além do humano. Máximo, o Confessor, apoiou isso no século VII d.C. C. A humanidade de Jesus não se fecha em si mesma nem nas horas mais difíceis da sua paixão, mas permanece aberta, capaz de um olhar amoroso também para com os seus assassinos. Esse amor impressionante tem o sabor de algo que não pode ser enquadrado nas realidades humanas.


mercoledì 2 aprile 2025

V DOMINGO DA QUARESMA/ C




Paulo Cugini 


Há uma novidade que somos chamados a abraçar neste tempo da Quaresma, uma novidade de vida nova, capaz de dar sentido à nossa existência, de fornecer água no deserto dos nossos caminhos áridos. Parece incrível, mas é verdade. Para compreendê-lo, porém, é preciso um requisito fundamental, indicado pelo profeta Isaías na primeira leitura de hoje, ou seja, parar de pensar no passado.

Não vos lembreis das coisas passadas,

nem considereis as coisas antigas!

Eis que faço uma coisa nova;

agora ele brota, você não percebe? (Is 43,18).

Encontramos a mesma ideia na segunda leitura de hoje, quando Paulo afirma: Considero tudo como perda, por causa da excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor. Por amor de Deus, perdi todas as coisas e as considero como lixo, para ganhar a Cristo e ser encontrado nele (Fp 3:8). Há, portanto, uma atitude espiritual que não nos permite captar a novidade de Jesus, sua mensagem inovadora, sua presença salvadora para a humanidade. Aqueles que permanecem ancorados em formas tradicionais de religião são incapazes de compreender completamente a novidade que é Jesus.

O que é essa novidade e qual é a profundidade qualitativa dessa novidade é expresso na passagem do Evangelho de hoje, que conta uma história que levou séculos para ser admitida no cânon. O perdão de uma adúltera por Jesus foi, de fato, considerado inadmissível porque, de acordo com os detratores de Jesus, teria criado um clima de negligência que abriria caminho para justificar a traição das esposas aos seus maridos. Também é interessante a natureza chauvinista da cena, na qual apenas a mulher é levada perante Jesus para julgamento: e o homem, e o adúltero, por que não foi acusado? É o resultado dessa cultura patriarcal que cavou um abismo entre as condições masculina e feminina ao longo dos séculos, um abismo feito de injustiças e abusos.

Eles disseram isso para testá-lo, para que pudessem ter alguma acusação contra ele. 

Os escribas e fariseus procuram Jesus não para ouvi-lo, como o povo faz, mas para testá-lo. Curiosamente, o verbo que o Evangelho usa para explicar o motivo da aproximação deles com Jesus é o mesmo usado para explicar a atividade de Satanás: testá-lo. Os escribas e fariseus não estão interessados em ouvir Jesus, eles querem desacreditá-lo diante do povo, porque com suas ações e suas palavras, ele está perturbando aquelas tradições religiosas, que dão poder e apoio à classe sacerdotal. Há, portanto, o mal nas ações dos escribas e fariseus, aquele mal que vem daqueles que estão cegos pelo próprio passado, daqueles que não querem olhar para a novidade do presente, porque isso significaria questionar-se, colocar-se numa perspectiva de mudança de vida.

À provocação dos escribas e fariseus, Jesus responde escrevendo no chão em silêncio: por quê? O que essa atitude significa? Na realidade, é um gesto profético que remete a uma passagem de Jeremias: "aqueles que vos abandonarem serão envergonhados; aqueles que se afastarem de vós serão escritos no pó, porque abandonaram o Senhor, a fonte de água viva (Jr 17,13). Afinal, havia pouco a dizer, porque do lado dos fariseus não havia a menor vontade de ouvir e se envolver. É por isso que Jesus não entra no campo da diatribe teológica, mas provoca um caminho de interiorização. Ele se levantou e disse a eles: "Aquele que dentre vós estiver sem pecado seja o primeiro a atirar uma pedra nela". É na consciência pessoal que Jesus provoca a reflexão dos ouvintes, porque é ali que está a possibilidade de ouvir aquela voz interior que revela o sentido autêntico das coisas.

«Mulher, onde estou? Ninguém te condenou? E ela respondeu: “Ninguém, senhor.” E Jesus disse: “Eu também não te condeno”.

 Este é o escândalo, a afirmação que os escribas e fariseus não queriam ouvir e que durante vários séculos deixou esta passagem fora do cânon: nem eu te condeno . Jesus é só amor, só misericórdia, é a possibilidade para todos recomeçarem, retomarem o caminho. Esta é a palavra que a Igreja deve saber dizer ao mundo: eu também não te condeno e, assim, abrir caminhos de misericórdia, libertando os homens dos sentimentos de culpa que os escravizam e que produzem a imagem de um Deus terrível, herança de medos ancestrais.

O sentido do caminho quaresmal deveria ser precisamente este: fazer-nos descobrir o rosto totalmente bom e misericordioso do Pai. Nenhuma condenação, nenhuma imposição, mas a possibilidade de um novo caminho.